gostasse de estar ao pé de mim: é que começava a sentir-se desambientado. Havíamos, de fato, trocado as posições; era agora a sua vez de suportar o leve constrangimento de viver de acordo com um conjunto de convenções a que não estava habituado. Achava enfadonho que as palestras fossem, agora, em português e não em urubu.
Tinha, entretanto, muita companhia, pois numerosos índios haviam chegado para se encontrar com João. A maioria deles trazia fardos de borracha, carne-seca de veado, couro de pecari, que João vendia, para eles, rio abaixo. Em troca, dava-lhes machados, facões, fumo e tecidos. Entre eles, havia um chefe chamado Shapi, que chegara com a mulher, três filhos e muitos outros homens de sua aldeia. Vieram de mãos vazias, mas esperavam todos receber presentes - e, na verdade, sabiam pedir facões.
"Eu trarei para você muita borracha" - disse Shapi - "mas agora eu quero facões".
João, algo desconfiado, deu-lhes um pouco de fumo e um facão para cada um. Foram-se, retornando na tarde seguinte, com pequena quantidade de borracha que nada valia. Shapi disse expansivamente:
"Borracha".
Ri-me e, como vingança, João atirou Shapi contra mim.
"Pede-lhe contas" - recomendou ao índio. Shapi, pedinte inveterado, não perdeu tempo. Recusei:
"Acabaram minhas contas".
"Mas minha mulher deseja algumas".
"Nenhuma ficou!"
"Contas azuis! Tem você contas azuis?"
"Todas se foram!"