Expedição às regiões centrais da América do Sul v.1

meio de nos passar o artigo comprado antes de lhe pormos nas mãos o objeto solicitado em pagamento. Cito este fato só para dar a medida do estado de moralidade em que vivem essas criaturas do deserto.

Era dia alto e o mar se tornara mais agitado; só com enorme dificuldade conseguimo-nos acercar das canoas, por causa dos rochedos que já pela manhã haviam sido grande obstáculo ao nosso desembarque. Safamo-nos não pouco borrifados e às dez da noite nos achávamos de novo a bordo. Soubemos que durante o dia os marinheiros tinham ido pescar na baía, caindo nas redes um tubarão, que foi morto a paletadas de remo; no ventre acharam-lhe nove filhotes vivos. O brigue pôs-se à vela durante a noite, e rapidamente nos afastamos das terras da África.

Como esperávamos, ao nos aproximarmos da linha equatorial, surpreenderam-nos as calmarias. Só pelos que por isso passaram pode ser avaliado o imenso tédio que se apodera dos passageiros ao ver as velas penderem flácidas dos mastros, ou se agitarem com violência, a intervalos irregulares. Durante muitas horas a superfície do mar se mostrava lisa como a de um espelho, mantendo o navio na mais absoluta imobilidade. A muito custo se sentia, à tarde, ligeira brisa; mesmo na ponte, ou sob a tolda, onde o termômetro marcava 30 graus, abafávamos de calor. Nossa atenção concentrava-se toda em alguns lindos moluscos, e nos vários zoófitos que, de quando em quando, ofereciam uma variante à monotonia de nossa situação. Certo dia, porém, nossos olhos de naturalista foram agradavelmente surpreendidos pelo aparecimento, à volta do navio, de número considerável de conchas chamadas Janthina, tão notáveis pelo colorido azul violáceo. Mantinham-se na superfície do mar, suspensas, por assim dizer, a uma massa vesiculosa branca, que lhes servia de bexiga natatória, e cujo ar talvez lhes fosse facultado expelir, para descer

Expedição às regiões centrais da América do Sul v.1 - Página 17 - Thumb Visualização
Formato
Texto