Ciclo do carro de bois no Brasil

cheias de braceletes, grampos e marrafas, encandeando o povo com os seus brilhantes; as meninas dengosas e cheias de cachos, parecidas com o louro Nazareno. Mas elas se tornavam diferentes dele, sobretudo por uma coisa: andavam cheias de broches, de anéis com pedras de valor, de trancelins, de voltas e teteias, muito do gosto da nossa boa e prestigiosa gente rural. O carro de bois foi contemporâneo dessa grandeza material e ajudou-a mesmo a crescer, espalhando os seus tentáculos por tecla a vasta extensão do país. Nele andavam pobres e ricos, desde o escravo ao senhor. Uma infinidade de coisas acompanha o seu ciclo: o gosto pelas boiadas gordas e lustrosas, especialmente escolhidas para a tração; a preocupação pelas toldas ou coberturas de chita encarnada, ondeando em ramagens e florões; o cuidado pela marcha do carro, marcha bem do jeito e da vontade do senhor, da sinhá, das sinhazinhas. Uns gostavam da marcha vagarosa, os bois andando lentamente, ao ritmo lerdo e meio espaçado do pio do carro; outros apreciavam a marcha mais ligeira; outros o carro em galope. Os carreiros conheciam comumente esses gostos, satisfazendo-os e apurando-os cada vez mais. Os carreiros escravos, guardando no peito a dolência e a doçura da raça africana, sabiam, como ninguém, apurar e fazer viver essas qualidades da alma humana. Os mulatos livres, quando davam para esses misteres, ninguém os excedia na criação e na valorização desses sentimentos tão caros à alma da sociedade rural. Sentimentos que ainda hoje, a despeito da decadência do domínio rural e em face das novas tendências de tudo nivelar e englobar na massa, ainda são comuns entre nós: e foram eles que fizeram em grande parte a felicidade, a alegria, o gesto de viver dos nossos antepassados."

Não discrepam os testemunhos de outras regiões do Brasil. Num dos números do Ostensor Brasileiro do ano de 1845, à pág. 299 do vol. 1.º, encontra-se a gravura de um carro de bois transportando para a festa uma família fluminense e a referência de que, na cidade de Campos (Rio de Janeiro), todos os anos se celebrava com pompa a festa de Santo Amaro (13 de janeiro) e que as famílias vinham das fazendas para a cidade em carros de bois.

Do extremo sul, falando dos velhos hábitos da campanha riograndense, PEDRO LUÍS OSÓRIO diz que "as famílias viajavam em carretas de bois com toldas, fechadas, com porta atrás e janelas laterais", o que é confirmado pelo Dr. SEVERINO DE SÁ BRITO em seu precioso livro Trabalhos e Costumes dos Gaúchos (1928), quando informa: "As famílias daquele tempo viajavam em carretilhas de bois, que representavam um pequeno aposento fechado, com porta atrás e janelas laterais."

Ainda hoje, apesar do crescente uso do automóvel e da melhoria das estradas, é o carro de bois empregado em tais transportes no

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