CAPÍTULO XX
ÚLTIMOS DIAS
A DOENÇA — ÚLTIMOS MOMENTOS — "A VIDA É BOA" — A MORTE.
Quando o Memorial de Aires apareceu, nos últimos dias de julho de 1908, havia já dois meses que Machado de Assis, doente, se ausentara do Ministério.
Realmente, embora não estivesse de cama, o seu estado de saúde era precário. Só o espírito era o mesmo, lúcido e forte, como foi até o fim. Mas todo o resto fraqueara. Já não falando do seu grande mal, muitos padecimentos o oprimiam. A vista, que nunca fora boa, baixava cada vez mais, impedindo-lhe o trabalho com luz artificial, tornando-lhe compacta a solidão das noites. A afecção intestinal de que já sofrera voltou a incomodá-lo. E uma úlcera na língua, talvez de fundo canceroso, começou a martirizá-lo. Quase não se podia alimentar. Passava a leite dias e dias. A origem dessa chaga parece terem sido as convulsões a que era sujeito, nas quais mordia a língua.
— Essas aftas, essas aftas! — costumava dizer, para disfarçar aos outros a causa verdadeira, que tanto o vexava.
Carolina, enfermeira dedicada, remediava a isso introduzindo-lhe uma rolha entre os dentes quando