A PANTOFAGIA OU AS ESTRANHAS PRÁTICAS ALIMENTARES NA SELVA

ABGUAR BASTOS

A bibliografia do Autor deste livro demonstra sua excepcional intimidade com os problemas da Amazônia. A maior parte de suas obras tem como campo de observação a Hileia. Neste volume é encarado a fundo um tema especializado.

O primeiro capítulo — "O complexo do barro" — revela a importância da argila na vida amazônica: material de construção, de fabricação de pontes e de alimentação, inclusive entre civilizados. Quando as dimensões avantajadas, a cerâmica pode servir de guarda de restos mortais.

A importância do sal na alimentação dos habitantes da Amazônia e em seu comércio interno é estudada exaustivamente, bem como a utilização de seus substitutivos.

A cinza é elemento de grande emprego na alimentação e dá origem a curioso fabulário. Os comedores de terra, vítimas da monotonia da alimentação de peixe e mandioca, sofrem, em consequência, de ancilostomíase. São levados a esse hábito pela fome, pela falta de sal, pela tradição. Mas, por outro lado, obtêm alguma resistência física através de minerais contidos na argila.

Capítulo do maior interesse é o estudo da antropofagia, distinguindo-a do canibalismo. Este constitui um rito sádico, de destruição do inimigo em regra dentro de um cerimonial. É ato de vingança e não de alimento normal. A antropofagia não era uma comilança por deleite, mas um culto do herói, já que o devorado devia portar-se bravamente.

Curioso é o estudo do hábito de comer larvas e insetos vivos não só entre os índios como entre populações rurais. Surpreendente é que muitos desses hábitos passaram às populações do campo até o presente.

A partir daí, o autor descreve os meios de obter o alimento, especialmente a caçada, variando conforme a tribo.

O estudo da culinária primitiva e da sua influência nos hábitos contemporâneos é feito com a mais severa técnica de pesquisa e com abundante documentação, inclusive com a experiência pessoal.

De valor extraordinário são os estudos acerca dos ritos relativos à alimentação, aos tabos (forma que o autor prefere a tabu) ligados à alimentação e à forma de cozinhar.

No gênero é obra pioneira e fortemente documentada.

A.J.L.