Machado de Assis, o homem e a obra – Os personagens explicam o autor

se deixou contagiar do entusiasmo sonoro da multidão: a 13 de maio de 88. Arrastado então no torvelinho, irá surpreendentemente, em carro aberto, às portas da Câmara, ovacionar Nabuco e outros abolicionistas, para depois, pela boca de um de seus personagens, negar o fato como se fora deslize. Mas o episódio é verdadeiro, apesar de inverossímil.

Tem parecido estranha tal compostura de Machado de Assis, destoante por completo do feitio daquelas épocas em que viveu. É a exceção irritante, tanto mais irritante, quando os homens de letras de sua geração, na quase totalidade, tomaram parte, alguns com veemência, outros com serenidade, mas todos com mais ou menos eficiência, nas lutas que deram nova feição social ou política à nação. Entretanto, é preciso julgar Machado de Assis segundo o temperamento, de acordo com o estilo, com a norma de conduta, que o destacou de maneira inconfundível. O que importa não é o caso em si de alheamento da política, até ao ponto mesmo de comprometer, aparentemente, os créditos de seu patriotismo ou do espírito de humanidade. Cumpre conhecer-lhe os motivos secretos, saber as razões que o determinaram. Mario Casasanta, em estudo crítico da obra do escritor, colhendo farta prova em suas páginas, sustenta que tinha tédio à controvérsia. A expressão é dele mesmo: tédio à controvérsia, aborrecimento de discussões, de disputas, de polêmicas, afinal. Essas cousas assustavam o homem tímido e espantado, não se lhe ajustavam ao espírito insuscetível de entusiasmo, à inteligência duvidosa e interrogativa. Foi, em nosso meio, uma das criaturas menos combativas que já se conheceram. Há mesmo, em tal sentido, o próprio depoimento de Machado. Uma espécie de programa cumprido à risca, ao contrário do que acontece quase sempre com programas. Apareceu no primeiro número da revista - O Futuro - em 1862, contava

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