Anchieta

O sr. Celso Vieira realizou essa obra arquidifícil e complexa, que exigia, além da cultura documentada e investigadora de um historiador perspicaz, a sutilíssima e quase anacrônica capacidade espiritual de compreensão de um santo e os dotes requintadamente literários de um ressuscitador de ambientes retrospectivos, dos mais difíceis de fixar em literatura, em cujos cenários haveria a movimentar a colisão do autóctone selvagem com os invasores europeus. Um labirinto de selvas na posse dos tapuias e dos tupis, onde um punhado de homens brancos se empenhava em fundar o esboço de uma nação; e no fragor dessa peleja, que se prolongava desde os redutos feudais do castelo de Olinda até aos planaltos de Piratininga e às praias da Bertioga, um santo macerado pelas disciplinas e os cilícios, uma alma com forma humana, que esparge sobre a tragédia a mais diáfana luz espiritual, — eis em resumo o que esse historiador tinha a descrever, quando de posse de todos os subsídios e aquisições de ordem histórica, religiosa, militar, étnica e naturalista exigidos para a mise-en-scene de uma tal ação.

Se, enlevado pela fascinação que a sublime figura exerce sobre as inteligências sensíveis que a contemplam, o seu admirável biógrafo nela condensasse o mérito exclusivo do prodígio operado, a história teria sofrido em sua substancial verdade. Isto, porém, não sucede. O que o Sr. Celso Vieira nos narra é a vitória da aliança entre o Estado e a Igreja, entre o Governo e a Companhia de Jesus, na formação do Brasil.

Tomé de Souza, Manuel da Nóbrega, Mem de Sá e Anchieta são as cariátides que sustentam o primeiro pavimento do edifício. Em volta dessas figuras proeminentes move-se a plêiade de cavaleiros e de padres que constitui a elite construtora da nacionalidade. É dessa aliança do arnês com a sotaina, da espada com o crucifixo,

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