Através do sertão do Brasil

e bonita serpente, quase preta, indivíduo da espécie denominada mussurana. A meu ver, é talvez a serpente mais interessante do mundo. É uma grande cobra de mais de um metro de comprimento, às vezes maior ainda, quase preta, mais clara na barriga, dotada de um natural plácido e pacato. Vive exclusivamente de outras cobras e é completamente imune ao veneno dos grupos das lachesis e das cascavéis, que compreendem todas as serpentes realmente perigosas da América.

O dr. Brasil contou-me que tinha feito muitas experiências com aquela interessante serpente. Não é muito comum e prefere lugares úmidos para viver. Põe ovos e a fêmea fica enrodilhada sobre eles — não para aquecê-los, ao que parece, mas com o fim de evitar evaporação excessiva. Não come quando muda a casca, nem no inverno. Exceto em tais ocasiões, necessita comer uma cobra pequena em cada cinco ou seis dias e uma grande por quinzena.

Há profunda diferença tanto entre as serpentes venenosas como entre as não venenosas, não só quanto à excitabilidade e irascibilidade, como em relação à capacidade de se adaptarem a um meio estranho. Muitas espécies de cobras não venenosas, inteiramente inócuas para o homem ou para qualquer outro animal, exceto para suas pequenas vítimas, são agressivas e truculentas, procurando picar a torto e a direito, à menor provocação — era o caso da espécie cujo espécime o doutor tinha posto anteriormente sobre a mesa. Além disso, muitas cobras, algumas venenosas, outras inócuas, são tão agitadas e assustadiças, que só com muita dificuldade se pode conseguir que se alimentem; a menor perturbação ou interferência impedirá que o façam. Há outras cobras, das quais a mussurana é talvez o melhor exemplo, que são prisioneiras dóceis e ao

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