O Selvagem

meio para indicar o lugar em que está o chefe, porque o costume é o de espalharem-se de dia e reunirem-se à noite para dormir. Não duvido asseverar que eles usam destes sinais com certa perfeição, de modo a designarem não só a presença de um chefe, como também qual dos chefes está presente, e afirmo isto porque já se tem dado comigo esse fato mais de uma vez.

Outro emprego do fogo, como auxiliar da pesca, é o seguinte: à noite os peixes de escama procuram os baixios para não serem devorados pelos enormes peixes de couro da família dos Siluros [Silurídeos], que a essa hora procuram de preferência suas presas. Os índios fazem com madeira rachada de ipê um facho; levam brasas na canoa, e, chegando ao baixio, acendem o facho; é de ver-se como os peixes começam a saltar e a cair dentro da canoa, às vezes em tal abundância que dentro em pouco tempo a enchem.

Para concluir com os diversos partidos que os índios tiram do fogo, como auxiliar da caça e da pesca, referirei uma singular caçada a que assisti junto a um lado das margens do Araguaia. Tendo-me encontrado com uma partida de xambioás, que andavam caçando, segui com eles para um lago que diziam ficava a não muita distância da margem. Efetivamente lá chegamos com légua e meia de marcha, e eles, depois de verificarem donde vinha o vento, prenderam fogo ao campo em semicírculo, de modo a cercar com o incêndio a parte do lago em que nos achávamos, para o fim, diziam eles, de caçarmos uma espécie de tartarugas de terra firme, pequenas, mas de sabor delicadíssimo, que existem em todo o vale do Amazonas. Com efeito, esse método de caçar com o fogo é excelente, porquanto apenas o incêndio começou a ganhar certa extensão as tartarugas começaram a procurar o lago, onde nós as apanhávamos em abundância e com grande facilidade;