O Selvagem

coloca a extremidade de uma vareta de madeira de cerne bem duro e, tomando esta última entre as palmas das mãos, imprime-se-lhe um movimento rotatório rápido; ao cabo de alguns minutos o fogo prende-se ao pó da madeira poída, comunica-se a ela e assim o acende.

8º Servem-se do fogo como meio de elevar a temperatura nas noites frias, ou, quando estão molhados, para se enxugarem. As nossas tribos sul-americanas, pelo menos as que estão compreendidas entre o vale do Rio da Prata e do Amazonas, não usam de espécie alguma de vestido senão como enfeite; é o fogo que restabelece o equilíbrio indispensável à saúde nas mudanças de temperatura, que tão sensíveis devem ser a corpos que não estão protegidos por nenhuma espécie de vestimenta. Nas noites de neblina e frio, — e as há bem frias nesses chapadões de campinas desabrigadas que dividem a bacia do Rio da Prata da do Amazonas — eles acendem grandes fogueiras junto às quais se assentam os velhos, contando aos guerreiros as histórias das guerras e emigrações da tribo, enquanto os mancebos dançam e cantam em torno delas. Quando dormem em suas redes, nas noites frias, acendem por baixo um fogo, que fica mais ou menos correspondendo à altura do peito.

Empregam também o fogo como agente terapêutico nos casos de serem mordidos por animais peçonhentos, como cobras e arraias; não queimam as chagas como nós fazemos: chegam o membro ferido junto ao fogo, enquanto podem suportar o calor; retiram-no em seguida para depois aproximá-lo de novo, até que à dor suceda uma espécie de torpor ou dormência; eu já fui curado assim por eles.

Do que tenho exposto se conclui, vê-se que os índios sul-americanos, com estes variadíssimos usos que fazem do fogo, sabem tirar-lhe pelo menos tanto partido