Ciclo do carro de bois no Brasil

Em torno do seu rádio, a uns raros amigos desolados com a queda da França, supondo que seria o fim da liberdade no mundo, Bernardino de Souza esclarecia e estimulava. "Ainda teremos muitas derrotas, durante dois ou três anos, mas a vitória final é certa. Os Estados Unidos não demorarão em entrar na guerra, a mobilização mundial virá em seguida e o esmagamento das potências totalitárias será completo." Lembro-me da esquisita sensação de sonho que estas palavras nos provocaram.

Aquele homem nunca saíra do Brasil, não participava da política nacional e muito menos da internacional, mas conhecia o mundo sem sair do seu gabinete.

E era o geógrafo completo, que balanceava os recursos naturais, a psicologia dos povos, as reações de cada um, numa antevisão de resultados que hoje podemos classificar de assombrosa. A resistência da Inglaterra, a invasão da África e do continente europeu, os combates finais, tudo isso Bernardino de Souza previu em 1940, em aulas de Geografia que foram as mais soberbas de quantas dele ouviram aqueles que nunca deixaram de ser seus discípulos. Pena é que as proferisse em família. Se as tivesse escrito e publicado, na época, teriam granjeado merecida admiração.

Passando a seus livros de história, veremos que, na essência, são trabalhos de geógrafo.

O elogio do Barão do Rio Branco (Bahia, 1912) e O Pau-Brasil na História Nacional (São Paulo, 1939) contam-se nesse número. O elogio de Rio Branco é de geógrafo para geógrafo: contém exame minucioso da espantosa erudição de Paranhos demonstrada nas questões de limites.

O volume sobre o "Pau-Brasil" é um admirável estudo de Geografia Humana, com toda a influência econômica e social do espécime da nossa flora que batizou o país.

É um rigoroso trabalho de pesquisa, suficiente para modificar o conceito, até então firmado, de que o ciclo econômico do pau-brasil esteve circunscrito ao século XVI. A documentação revelada demonstra que tal ciclo veio até o último quartel do século XIX, independente do desenvolvimento das plantações de cana e da fabricação do açúcar.

Oliveira Viana apreciou o trabalho quando apresentado ao Terceiro Congresso de História Nacional, afirmando: "deve ser considerado como um perfeito modelo no gênero. Não se podia versar o assunto, aliás extremamente especializado e aparentemente árido, com maior largueza de visão histórica, nem maior profundeza e riqueza de erudição".

As pesquisas em material ainda inexplorado, a reunião de elementos dispersos na história, na geografia, no folclore, constituíram, no estudo sobre o pau-brasil, experiência e sugestão para o trabalho sobre o carro de bois.

Pouco depois de publicada em livro a tese que apresentara ao III Congresso de História Nacional, começou Bernardino de Souza

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