Viagem ao Brasil nos anos de 1815 a 1817

velho, não tornou parte no combate, ficando constantemente na retaguarda.

Todos nós deixamos então o campo da luta, juncado de batoques de orelha e de paus quebrados, e voltamos para o "quartel"; onde encontramos os velhos conhecidos Jukeräcke, Medcanu, Ahó e outros, lastimavelmente cobertos de pisaduras; mas não ligavam importância aos membros inchados, demonstrando até que ponto pode o homem castigar-se; chegavam a se deitar sobre as feridas abertas e a comer avidamente a farinha que o comandante lhes deu. Os arcos e as flechas dos selvícolas ficaram, durante todo o combate, encostados às árvores vizinhas, sem que lhes tocassem; dizem, entretanto, que, em tais ocasiões, já aconteceu algumas vezes largarem os páus e pegarem das armas, motivo por que os portugueses não gostam muito de semelhantes pelejas próximo a eles. Só algum tempo depois soube da razão do combate, de que fora expectador. O "capitão" June, com seu povo, estivera caçando na margem sul do rio, nas terras de Jeparack, matando alguns porcos do mato. Este se sentiu grandemente insultado; pois os "Botocudos" sempre respeitam, mais ou menos estritamente, os limites das zonas de caça, que, em geral, têm o cuidado de não ultrapassar; tais infrações constituem os motivos habituais das querelas e guerras. Um único combate igual ao acima descrito ocorrera antes perto do "destacamento" dos Arcos, e foi, portanto, um acaso muito feliz que me permitiu assistir a esse espetáculo durante a minha curta estadia no lugar. Muito raramente os estrangeiros conseguem testemunhá-lo, embora seja tão importante para os que querem conhecer perfeitamente os selvagens e o seu caráter. Pouco depois da minha partida do Quartel, segundo me informaram, deu-se aí um combate ainda maior, por ocasião da volta do "capitão" Gipakeiu, amigo e aliado do "capitão" June.

Como vários negócios exigissem a minha volta ao Mucuri, deixei a ilha da Cachoeirinha no fim de setembro e desci o rio para a Vila de Belmonte. A viagem foi um pouco demorada, porque, a esse tempo, as águas estavam baixas; a caça, porém, ao lado da observação de muitas curiosidades naturais, tornou-a agradável e divertida. Nas margens do rio, então emersas, vimos os buracos feitos pelo extraordinário peixe que Linneu chama Loricaria plecostomus; é conhecido, aí, por "cachimbó" ou "cachimbao"; para o norte, nas margens do rio Ilhéus, é denominado "acari", e Marcgrave, que o observou em Pernambuco, descreve-o com o nome de "guacani". Quando quer repousar, cava buracos de profundidade insignificante da margem, procurando apoio contra a violência da corrente, na época da cheia; por vezes, afirmam os pescadores, bate no fundo das canoas, o que dizem fazer com a cabeça, enquanto come a lama e Byssus, que habitualmente aderem ao fundo das embarcações.

A primavera já ia muito avançada, e ouvíamos frequentemente, nas florestas, a voz forte e grave do "mutum" (Crax Alector, Linn) que ecoava pelas brenhas, facilitando muito a caça dessa grande e bela