na essência da personalidade; as tendências apenas indicadas, os sonhos desfeitos, os encontros fortuitos são, não raro, muito mais importantes; e não serão também fertilíssimo material para a biografia?
Foi o que aconteceu com Machado, e, assim, a sua biografia há de ser sobretudo a biografia do seu espírito. Embora tenha recolhido sobre ele valiosos depoimentos, creio que a melhor chave desse cofre de segredos está nos seus escritos.
A obra de arte pôde ser uma fixação do excesso de vida, um transbordamento da personalidade, ou uma evasão, fruto da incapacidade de viver.
Em Machado — voltamos ao seu eterno meio-termo — foi uma e outra cousa. É que ele foi, a um tempo, um forte — uma vontade muito ambiciosa e um raciocínio muito independente — e um fraco, enleado na sua timidez.
A sua obra foi uma evasão, permitindo a esse tímido dizer o que não ousava fazer, mas foi também um transbordamento do eu, traindo quase sempre os pontos de mira desse ambicioso, os ideais que queria alcançar — e alcançou — na sua existência real.
Sob esse aspecto, há nos seus livros muito de autobiografia.
Não terá contado propriamente as circunstâncias da sua existência, mas exprimiu os sentimentos que elas lhe provocavam. Podemos dizer que a sua