última encarnação dos encantos da vida para o artista em vésperas de deixá-la.
Mas, ainda assim, não revela menos a força de reação em Machado de Assis, e nem por isso deixa de ser, no Memorial de Aires, uma nota de frescura e alegria.
Não é um romance, esse último livro do grande romancista; é mesmo um memorial, um diário íntimo, anotações de fatos e caráteres, sem preocupação de enredo.
Os amores de Fidélia e Tristão são apenas um episódio. A verdadeira trama do livro está nas reflexões do Conselheiro Aires.
Que serenidade, que indulgência elas revelam. Chegado ao fim dos seus dias, depois de ter lutado muito e muito sofrido, depois de ter em vão tentado descobrir um sentido para a vida, depois de ter negado e se revoltado, Machado de Assis se deixa penetrar pela doçura de existir. A bondade de D. Carmo, a mocidade de Fidélia o reconciliam com a vida.
O contato de algumas criaturas generosas paga a pena de estar no mundo.
E tudo parece adquirir uma suavidade nova, uma transparência, uma luminosidade diferente. As criaturas passam a ter valor por si mesmas, e não pelo que possam interessar ao planeta Saturno. A voz humana já não se perde na imensidão de um