Ensaios brasilianos

Sois também um artista, Sr. Miguel Osório. Conseguistes facilmente exprimir, no estilo nervoso as angústias de algumas almas sem abrigo, que bem aconchegadas protegeis nos macios refolhos de aguda sensibilidade. Confessais que não sabeis ao certo se o vosso belo volume encerra um romance. Pouco importa. A vida, em si mesma, ainda é a melhor das urdidoras. No livro há gente tão viva, que os críticos até imaginaram seres do vosso conhecimento objetivo.

Gente que ama e sofre... Deve ser mesmo um romance. Os romancistas pensam que inventam: mas quando o livro é dos que ficam, a história foi um logro que a natureza passou no escritor. Estava dormindo nos complexos, diria Medeiros, nas dobras profundas da personalidade.

Não devem ter muita razão os críticos de que nos falastes. O homem de ciência — é lição dos vossos trabalhos — a não ser os que se encarquilham na esterilidade das taxinomias exclusivas e pedantes, não pode caminhar sem o estímulo de um sonho de verdade e de beleza, que a imaginação aquece. A verificação — outra coisa. Tendes sido o exemplo da vossa geração, arquiteto de edifícios biológicos complexos e úteis, alguns belos e poéticos.

Quem conheceu o solar do vosso pai — casa de requintes espirituais — o ambiente em que vos criastes, numa fraterna e preciosa agitação de ideias nobres e boas, não pode ter surpresa alguma vendo o vosso nome de professor dos mais seguidos, luzir tão bem no Uruguai ou em Paris, falando aos alunos da Praia Vermelha ou aos colegas da Sorbonne. Surpresa haverá, muito justa, ao percorrer tudo que tendes realizado na fisiologia experimental, no meio ainda modesto dos nossos recursos nacionais. Fostes inovador dos mais firmes e brilhantes.

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