A pantofagia ou as estranhas práticas alimentares na selva. Estudo na Região Amazônica

Os Bakairi geralmente os jovens, nas coplas de pedir comida, como já vimos, alegavam os serviços prestados na construção das casas, na poda dos mandiocais, no arrancamento dos tubérculos, e diziam que, sem eles, as mulheres ainda estariam nas casas velhas, ainda errariam pelo mato, sem abrigo. Não só cantavam às portas, como entravam nas malocas e dançavam.

A dança rural da "Saracura" também é dança de pedir comida, como demonstração reiterada de que o alimento é de todos.

Os alimentos "privativos" dizem respeito aos que são exclusivos a indivíduos ou grupos. É costume reservar parte da caça aos homens. Entre os Suyá, cabem privativamente ao homem os miúdos nobres da anta, que são pilados com o caldo e misturados com farinha de mandioca.

O macaco, entre os Erigpagtsá (rio Juruena), é a caça mais abundante e, portanto, mais consumida. Ainda aí os miúdos cabem aos homens, além da cabeça do animal, que é assada.(74) Nota do Autor Também a cabeça do porco do mato tem o mesmo destino.

A privatividade por grupos sociais ou etários podemos ver entre os Suyá (rio Xingu), tribo identificada aos Txukahamãi ou Metotire. A divisão de uma anta observa tal regime:

"No porto mesmo, o tapir foi dividido não pelo índio que o abateu, mas pelo chefe da tribo. Após o retalhamento da anta a carne foi dividida em seis partes. Uma delas, consistindo do coração, fígado, rins, porção privilegiada [...], foi levada para a casa das flautas e imediatamente posta para cozinhar. Posteriormente, uma porção foi pilada e, com o caldo, misturada com farinha de mandioca e consumida com o mingau. Apenas os homens participaram desse festim. As cinco partes restantes foram distribuídas pelos grupos de parentesco das unidades residenciais. Na maloca do chefe foram distribuidas duas partes, uma para os chefes, suas esposas, filhos e filhas e os agregados. A esposa mais velha do chefe, índia de procedência waurá, cuidou de mandar moquear e cozinhar a caça. A outra parte, foi endereçada à sogra do índio Trumai, suas filhas, as esposas do referido índio, filhos e netos. Uma parte foi entregue na maloca onde residem os dois grupos poligínicos e um casal monogâmico [...]. Na última maloca uma parte da carne foi entregue às mulheres que mantêm relações com o chefe da casa: sua esposa e irmã. A outra parte para uma índia Txucahamãe e sua prole".(75) Nota do Autor

Nota-se na descritiva: a) que a caça foi dividida no porto e não na aldeia propriamente dita; b) que as partes nobres foram recolhidas à "casa das flautas", ou seja, à casa onde são guardados os instrumentos

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