Prefácio
Seria interessante lavor o de aquilatar a precisa contribuição da experiência e do estudo dos estrangeiros na informação e na interpretação da nossa História, desde os clérigos, aventureiros e mercadores, que supunham registrar "il vero delle cose certe", como de suas crônicas dizia Dino Compagni, e os cientistas e artistas analisadores da natureza e fixadores de usos e costumes, até os historiadores, propriamente, que contrastaram a fragilidade dos dados e depoimentos pessoais com a força das coisas e a sua duvidosa documentação. Qual teria sido o real quilate dos testemunhos de Staden, Thevet, Schmidel, Léry, Lindley, Tollenare, Koster, Mary Graham, Luccock? O das observações escritas e figuradas de Marcgrave, Franz Post, Eschwege, Saint-Hilaire, Martius, Debret, Rugendas, Chamberlain? E o da fundamental colaboração de Southey? E, recentemente, de intelectuais do tope de Roger Bastide, Roy Nash, J. F. Normano e Germain Bazin?
Essas considerações vêm a propósito do presente livro, A Idade de Ouro do Brasil, escrito, sob os auspícios da Sociedade de Estudos Históricos Dom Pedro II, pelo Professor C. R. Boxer.
Antes publicara o ilustre professor de português camoniano do King's College da Universidade de Londres um excelente trabalho sobre as vicissitudes da guerra holandesa, The Dutch in Brazil, dois ensaios setecentistas e um estudo sobre Salvador de Sá, gemas de primeira água, reveladoras de largos conhecimentos, penetrante indagação pessoal e elevado senso de inter-relação e interdependência dos acontecimentos no plano histórico.
O que distingue o historiador do redator de crônicas ou de relações é exatamente a explicação dos fatos. Estes por si não se explicam. Menos os explicam os sucessos imediatos, antecedentes e consequentes, e os ditos e registros dos contemporâneos, sejam atores sejam espectadores. Nada mais induz a erro do que aceitar depoimentos e julgamentos coetâneos sem prévia filtragem de quanto narram, apoucam, exaltam e censuram. A explicação dos fatos flui de exames profundos e de injunções distantes, algumas aparentemente estranhas, e sobretudo flui de serem os fatos em causa