Machado de Assis, o homem e a obra – Os personagens explicam o autor

Quer ser sábio? Outro humorista, Henrique Heine, descreve-nos a trajetória de suas pesquisas, procurando a verdade com todos os instrumentos da inteligência. Já velho, ainda insatisfeito, vem a morte e, diante de sua última pergunta, responde-lhe com um punhado de terra pela boca. Mas isto é resposta que se dê?

É a arte que o tenta? Então, vemos, na alma do artista, aquela irremovível consciência de incapacidade expressional do personagem da história de Machado de Assis, a procurar o andamento e termo de um canto esponsalício, que o persegue a existência inteira. Já prestes a morrer, ouve, do seu aposento de artista, à janela da casa vizinha, uma jovem que, facilmente e graciosamente, emite as notas buscadas em vão por ele, e que canta, sorrindo, sem esforço, sem saber que a melodia é arte. Canta como a ave canta.

Para explicação do humour, é pois útil atentar para a humorista. E este é um revoltado que falhou do ponto de vista social ou do ponto de vista da espécie. Afrânio Peixoto diz verdade, ao afirmar que engraçados são desgraçados(1). Nota do Autor Mas a revolta, aqui, não tem o sentido de querer reparar um erro da natureza ou injustiça dos homens, é mais profunda, porque o humorista sabe que o seu sofrimento é condição da vida, tributo da espécie a que pertence. Então, busca compensação no pessimismo e na teorização ou análise pessimista da vida, que a todos flagela.

No "O delirio", o mais forte capítulo do Braz Cubas, Natureza ou Pandora, mãe e inimiga do homem, fala ao pobre Braz delirante:

- Não te assustes, minha inimizade não mata; é sobretudo pela vida que se afirma. Vives: - não quero outro flagelo.

Machado de Assis, o homem e a obra – Os personagens explicam o autor  - Página 449 - Thumb Visualização
Formato
Texto