Machado de Assis, o homem e a obra – Os personagens explicam o autor

- Não?

- Ouve o resto.

A sege no meio do caminho achou um obstáculo e derribou-o; esse obstáculo era minha avó. Se em vez de minha avó, fosse um rato ou um cão, é certo que minha avó não morreria, mas o fato era o mesmo".

Encarado por outro aspecto, vemos que existe também no humorismo uma espécie de dinamismo natural, - anterior e superior aos costumes, aos preconceitos, à moral do homem, tanto do ponto de vista social como religioso. Por isso é que, nas cenas ou trechos de humour da obra de Machado, entram as crianças, os loucos, os avaros, os obcecados, todas essas criaturas antissociais ou antimorais pela irresponsabilidade.

No Alienista, o dr. Simão Bacamarte, médico da vila de Itaguaí, dominado pela ideia fixa de hospitalizar todo louco a seu alcance, torna-se insano, ele próprio, internando-se por fim no hospital que fundara. O caminho percorrido por ele, para chegar a essa conclusão, está cheio de incidentes significativos do melhor humour. A força da natureza cega suprime, para ser igual a si mesma, preconceitos, moral, inteligência, tudo. O humorista imita-a, e cabe dizer que está mais próximo dela, como intérprete de seu poderio obscuro. Daí a impressão de desconcerto, que transmite. Mas parece que a diferença entre um e outro, nos processos de destruição, está em que uma é brutal, e outro vagaroso. É a diferença que vai de um cataclismo a um método lento de envenenar. A natureza é trágica, o humorista dissolve a tragédia pelo raciocínio. Não há cólera aparente em sua maneira de atuar. E põe a vida contra a vida, desconcertando a vida, mesmo em fatos somenos. Na A chinela turca, o autor de D. Casmurro vale-se, por exemplo, de dois indivíduos movidos de desejos antagônicos: Duarte, que está pronto em sua casa, para ir ver a namorada e o major Lopo Alves, que importunamente

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