a liberdade. Influiria também no caso o fato de não ter sido senhor de escravos de cor diferente da sua. Ignoramos, contudo, o que o futuro nos reserva. Pode muito bem acontecer raiar um dia em que caprichosa volta do destino leve a insensatez dos homens a destruir o Velho e o Novo Mundo, em luta que deixe de parte o continente negro sito abaixo do equador. Veremos então os remanescentes brancos da catástrofe aparecerem famintos na embocadura do Níger ou do Congo, a implorar abrigo e assistência dos nativos por tanto tempo desprezados. Sonho? Pesadelo? Fantasia? Por que duvidar? Sucedem-se hoje com tal rapidez as mais incríveis transformações, que desaparecem limites entre o real e o irreal, o certo e o absurdo, o verdadeiro e o fantástico! Imaginaria no início do século um conselheiro de S. M. o Tzar de todas as Rússias, que as discriminações raciais vigentes no império moscovita seriam a causa do seu desmoronamento? Que judeus polacos por ele considerados como nojentas sevandijas derrubariam o trono de Ivan, o Terrível e substituiriam o conselheiro de S. M. no governo do Báltico ao estreito de Behring e do polo norte à Índia? Tampouco, poderia um nipão desvairado em 1940, por delirante fanatismo nacionalista, imaginar que a bomba de Hiroschima bastaria alguns meses mais tarde para pulverizar os seus planos de dominação na Ásia. E quem jamais conceberia, antes de 1914, tamanhas mutações registadas em tão curto espaço? Bastou pouco mais de três décadas para transformar o mundo! E, que transformação!
Há conserto para tudo, mas os obstáculos raciais são os mais difíceis de transpor na era contemporânea depois do esmaecimento da divisão em castas da sociedade. Assumem até aspeto de irremovíveis onde cores epidérmicas representam vencedores e vencidos, antigos senhores e escravos, superiores e inferiores, como se uns arvorassem no rosto o distintivo do mando e os outros