Três panfletários do Segundo Reinado

da vida, quando a bronquite crônica de que sofria em moço se foi transformando em opressora asma cardíaca; os lábios grossos, o inferior um tanto penso, belfo. Usava óculos fixos de aro de ouro sobre os olhos pardacentos, esbugalhados, e basta cabeleira postiça, sob um chapéu alto de abas um tanto largas, com o rosto liso e a barba sempre escanhoada em regra, aspecto de comodista e gordalhudo pastor protestante. Vestia-se, porém, com o maior apuro, buscando conservar certa elegância de bom cunho parisiense, na sobrecasaca rigorosamente abotoada e bem assente ao corpo, nas gravatas de gosto com alfinetes artísticos, nas botinas envernizadas, sem nunca dispensar luvas, que trazia quase todo o dia calçadas. Gostava de bengalas de valor e delas tinha grande variedade; nem jamais se o via de guarda-sol ou de chapéu de chuva, como é tão geral no Brasil, hoje ainda mais do que outrora. Professava todo um sistema de ideias acerca da cor da gravata apropriada ao dia e da pedra preciosa que tinha de nela figurar; e, numa feita, o ouvi discorrer com muito espírito, erudição e habitual solenidade de frase sobre a significação das gemas entre os antigos e particularmente hebreus, e sua adaptação às roupagens que deviam fazer realçar — o diamante sobre o estofo preto, a safira sobre o branco, a esmeralda no vermelho, o topázio em cima do azul, e assim por diante. — "É preciso, aconselhava ele, não deixar aos medíocres e tolos sequer essa superioridade: trajarem bem. As exterioridades têm inquestionável importância. A um tresloucado e criminoso é muitíssimo mais fácil dar logo cabo de qualquer maltrapilho do que simplesmente desrespeitar um homem revestido das insígnias de alta posição social. Conturba-o a certeza de que esse insulto será incontinente punido pelas leis e pelas autoridades". Consoante

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