PREFÁCIO

Se existe um período da história portuguesa que bem mereça as vigílias do investigador, pelas muitas lacunas que ainda não permitem sua plena compreensão, a época do governo filipino talvez seja a que mais carece de ser iluminada pela História.

Período que se pode considerar fundamental para o assentamento das raízes portuguesas no Brasil, pela série de reformas com que a Administração procurou valorizar o imenso território, fixando núcleos de população, abrindo os caminhos do interior e criando novas formas de vida política, social, religiosa e econômica. Para além da sua estrutura portuguesa, o Brasil filipino integrou-se então numa escala atlântica, compartilhando do choque de interesses entre o Império espanhol e outras grandes potências, como a França e as Províncias Unidas. Assim, durante os 60 anos do governo da Espanha, o Brasil deixou de ser apenas uma tentadora miragem ou um campo de ambição das nações europeias, para se integrar no complexo atlântico que dele fazia um espaço por excelência na política dos oceanos.

Essa deslocação de um Brasil ainda de marca portuguesa e "regional" para um outro Brasil de concepção "atlântica" acentua-se de 1580 a 1640, graças ao papel da Administração, quase sempre eficiente, e ao esforço criador do homem português que se prendeu à terra com os laços da presença e do trabalho. O fascínio dos primeiros moradores, que apenas viam no Brasil "um outro Portugal", na expressão colorida do padre Fernão Cardim, torna-se agora em epopeia de defesa e de penetração no interior. E fundam-se povoados, abrem-se linhas de comércio, criam-se cargos públicos e aumentam os interesses privados,