Uma comunidade rural do Brasil antigo. Aspectos da vida patriarcal no sertão da Bahia nos séculos XVIII e XIX

INTRODUÇÃO

ESTA É A HISTÓRIA de uma fazenda de criação dos sertões da Bahia, num lapso de tempo de 150 anos, dentro dos séculos XVIII e XIX. É uma reconstituição da fazenda do "Brejo do Campo Seco", nos seus aspectos social, econômico e histórico. Trata-se de uma propriedade rural que existiu, outrora, em terras do município de Bom Jesus dos Meiras, hoje denominado Brumado.

Farta messe informativa, colhida em arquivo particular, possibilitou-me a elaboração de uma espécie de retrato de uma velha zona rural. Intencionalmente descendo a minúcias, e como que armado de uma grossa lente de aumento, procurei focalizar, em ponto grande, um pequeno centro nordestino do Brasil antigo.

Escorado em valiosa e inédita documentação, zelosamente conservada por quatro gerações, tentei traçar o esboço ecológico de uma fazenda de criação nos seus cento e cinquenta anos de existência. Em seus aspectos gerais e, principalmente, particulares, estes aparentemente secundários, mas na realidade de grande interesse, descrevi a terra e a gente, a atividade econômica e a social, de forma a permitir ao curioso de hoje o conhecimento da própria intimidade da vida, numa comunidade rural do Brasil de antanho. Essa foi a meta a que me propus, neste ensaio, isto é, situar a criatura, no seu tempo e ambiente, e descrevê-los, ambiente, tempo e criatura, com abundância de particularidades que permitam, ao desconhecedor do assunto, a visão de um século e meio de vida comum, corriqueira, de existência normal e rotineira, dia a dia decorrida num centro sertanejo do país. Visão de um passado não tão recuado no tempo, mas essencialmente diferente dos dias atuais, diferença que se nota mesmo na região em causa - por mim visitada e percorrida em 1951 - onde o rádio, o avião e o automóvel vem imprimindo uma acelerada metamorfose. O interior do país, que era ainda há pouco o museu vivo do passado, despoja-se rapidamente de suas características. Costumes ou atitudes sociais, métodos de trabalho, fatores ou agentes econômicos e até mesmo uma terminologia peculiar à região em estudo, expostos e descritos neste ensaio, de há muito desapareceram do aludido cenário, onde são totalmente desconhecidos dos atuais habitantes.

O arquivo do "Sobrado do Brejo" era, até princípios do século XX, um volumoso repositório de centenas de papéis. Constituía o arquivo da família Pinheiro Canguçu e compunha-se de livros comerciais e memoriais, patentes militares, documentos relativos ao Santo Ofício, testamentos, instrumentos de doações, papéis referentes

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