primeira de Itaguaí, mais grandiosa do que a Casa Verde, mais nobre do que a Câmara. Entre a gente ilustre da povoação havia choro e ranger de dentes, quando se pensava, ou se falava, ou se louvava a casa do albardeiro - um simples albardeiro, Deus do céu!
"Lá está ele, embasbacado, diziam os transeuntes, de manhã.
De manhã, com efeito, era costume do Mateus estatelar-se, no meio do jardim, com os olhos na casa, namorado, durante uma longa hora, até que vinham chamá-lo para almoçar. Os vizinhos, embora o cumprimentassem com certo respeito, riam-se por trás dele, que era um gosto. Um desses chegou a dizer que o Mateus seria muito mais econômico, e estaria riquíssimo, se fabricasse as albardas para si mesmo; epigrama ininteligível, mas que fazia rir às bandeiras despregadas" (II, 265, 266). Claro, patente, o contraste entre a classe, fundada numa situação exclusivamente econômica, e a gente ilustre, os principais, alheios ao mercado, valorizados por um comum sentimento de honra, influência e prestígio. O estamento impede, obscurece, denigre a classe, com suas riquezas e pompas. O opulento albardeiro - "um simples albardeiro, Deus do céu!" - não ingressa na alta-roda, no círculo dos notáveis, que ri de sua fortuna, achincalhando-a como se fora composta de moedas falsas. A riqueza ainda não ganhara respeito, o respeito que cercaria o barão de Santos ou o Palha, astutos especuladores que, mais tarde, acumulam grandes cabedais.
Na sociedade do século XVIII, um rico comerciante fugia da situação de classe, para granjear o respeito e a estima, com os títulos e as insígnias da nobreza. É o caso do pai do jovem Nicolau (Verba testamentária, II, 352), que, para dar luzimento ao filho, comprou-lhe a patente de capitão. "O vice-rei, que era então o conde de Resende, andava preocupado com a necessidade de construir um cais na praia de D. Manuel. Isto, que seria hoje um simples episódio municipal, era naquele tempo, atentas as proporções escassas da cidade, uma empresa importante. Mas o vice-rei não tinha recursos; o cofre público mal podia acudir às urgências ordinárias. Homem de estado, e provavelmente filósofo, engendrou um expediente não menos suave que profícuo: distribuir, a troco de donativos pecuniários, postos de capitão, tenente e alferes. Divulgada a resolução, entendeu o pai de Nicolau que era ocasião de figurar, sem perigo, na galeria militar do século, ao mesmo tempo que desmentia uma doutrina bramânica. Com efeito, está nas leis