E foi por diante, demonstrando, somando e concluindo: - "Justamente, três mil contos!" (II, 423) A situação econômica, definida no patrimônio ou na percepção de rendas, determina a classe, o tipo de classe a que pertence o homem. A classe não é uma comunidade, embora, com base na solidariedade que inspira, possa levar às mais variadas formas comunitárias.
A sociedade de classes, malgrado se firme e se estruture com maior energia, não domina o campo social. Entre dois polos, a colônia e a fase do encilhamento, mostra ela desenvolvimento sensível, com a mudança de uma estrutura. A velha sociedade de estamentos cede lugar, dia a dia, à sociedade de classes. Entre A anedota pecuniária e O alienista nota-se que a perspectiva sob a qual se estratificam as camadas sociais é diferente em toda sua extensão e profundidade. O alienista (II, 255) tem como cenário uma cidade colonial, Itaguaí. O Dr. Simão Bacamarte é filho da nobreza da terra - este título tem especial relevo, à época. A tradição e o nascimento ilustre, traços de estamento e não de classe, são destacados pelo cronista de modo caricatural. Simão Bacamarte alcançou da Câmara "uma postura autorizando o uso de um anel de prata no dedo polegar da mão esquerda, a toda pessoa que, sem outra prova documental ou tradicional, declarasse ter nas veias duas ou três onças de sangue godo" (II, 279). A vila era dominada pelos principais, vinculados à Câmara, gente de dinheiro e influência na corte (II, 284). O dinheiro andava casado ao prestígio social, mas não era, em si, traduzido em bens ou rendas, que explicassem a honra da supremacia. Esta existia fundada em outras bases - tradição, modo de vida, educação e origem fidalga. Prova a separação de uma camada a outra o altivo desdém com que era recebido, entre os afidalgados "homens bons", o homem do povo enriquecido. Aí está a figura do Mateus, combatida e desprezada, malgrado a opulência. "Acabava de construir uma casa suntuosa. Só a casa bastava para deter e chamar toda a gente; mas havia mais - a mobília, que ele mandara vir da Hungria e da Holanda, segundo contava, e que se podia ver do lado de fora, porque as janelas viviam abertas -, e o jardim, que era uma obra-prima de arte e de gosto. Esse homem, que enriquecera no fabrico de albardas, tinha tido sempre o sonho de uma casa magnífica, jardim pomposo, mobília rara. Não deixou o negócio das albardas, mas repousava dele na contemplação da casa nova, a