Naquela sala de jantar viu a minha infância desfilar tudo o que restava da monarquia: tio Carlos Afonso, irmão de Vôvô, terrível de mordacidade e arrogância; o barão de Ibituruna, com a sua eterna sobrecasaca, vagamente parecido com o Imperador; o visconde de Saboia, médico da família; o desembargador Valle, chegando sempre apressado de S. Paulo, e crivando o "Afonso", como chamava Vôvô, de perguntas e remoques; o major Galvão; meu avô materno, o barão de Itahipe; o general Couto de Magalhães; o visconde de Lima Duarte; o barão de Javari, cunhado de Vôvô; o comendador Mafra; o conde de Figueiredo com suas longas suiças esvoaçantes; o conselheiro Cândido de Oliveira; o barão e a baronesa de Loreto, e, quando vinham da Europa, os barões de Muritiba; o comendador Sampaio, o coronel Gentil de Castro, seu Gentil como era chamado na intimidade; Max Fleiuss, moço e recém-casado, e, às vezes, qual meteoro revolucionário pela sua originalidade, sua ironia, o seu espírito; Martim Francisco, o terceiro, o Martimzinho da família, em atropelada visita a "tio Afonso" como chamava a Vôvô. Vôvô Celso era o centro de toda aquela convivência social e, quando se referia aos acontecimentos do passado, ouviam-no todos com a expressão viva da verdade tal a isenção de ânimo com que falava. Descria naturalmente dos possíveis benefícios da República, mas nunca lhe ouvi palavra de descrença ou de azedume contra o Brasil. Punha-o, por assim dizer, acima dos partidos e dos homens. Naquela vida retirada, simples e trabalhosa da Chácara, dava-nos sem querer um alto exemplo de dignidade e compostura. Se, realmente, o triunfo de muitos adesistas lhe trazia por vezes aos lábios um sorriso de sarcasmo, não se detinha em lamúrias sobre o que perdera com o advento republicano".