O Médio São Francisco. Uma sociedade de pastores guerreiros

Itaberaba, grandes áreas abandonadas pelo gentio perseguido foram incorporadas à Colônia. Embora se tenha tornado polêmico o conceito de terra devoluta, no médio e alto São Francisco, desde o começo do Brasil, aqueles vastos sertões estão sob o regime da propriedade privada, e, passando de dono para dono, formam as fazendas dos dias presentes. Além dos dois grandes senhores, como Garcia d'Ávila e Guedes de Brito, centenas de outros desbravadores - como Domingos Afonso Sertão e seu irmão Julião, Cosme de Brito, Jerônimo Serrão de Paiva e Paulo Viveiros Afonso(14) Nota do Autor, tendo este último ficado imortalizado na grande Cachoeira que lhe guardou o nome e inspirou o maior dos nossos poetas - possuíam terras no sertão do São Francisco, no alborear dos primeiros dias do Brasil-Colônia. Muito antes das expedições feitas por Bernardo Vieira Ravasco, a mando de Antônio Guedes de Brito, Francisco Dias d'Ávila realizava incursões ao longo do São Francisco, tendo deixado, com a sua morte, grandes extensões de terra - que iam da barra do Salitre até as vizinhanças do gentio Morpará ao seu filho, que soube continuar a sua obra, realizando entradas e requerendo sesmarias. A manutenção desses latifúndios, naqueles tempos, era trabalho para titãs. A indiada, em constantes sortidas contra os currais, os agregados (nativos ou portugueses) em frequentes rebeliões, transformavam a vida daqueles retardados senhores feudais em ininterrupta e permanente guerra, ora tendo eles de oferecer combate a índios selvagens ou servos amotinados, ora sendo forçados a enfrentar as casas rivais, cuja fome de terra não era menor. Para aumentar a crueza da vida dos pioneiros do latifúndio no vale, surgiu, com a adoção do braço escravo vindo da África, a ameaça dos quilombolas, negros rebeldes, que fugindo ao cativeiro no litoral, tentavam organizar, nas brenhas, reinos e repúblicas ao seu jeito. Mas, mesmo na luta contra o "perigo negro", os pioneiros e criadores do vale iriam encontrar uma fonte de renda a mais. Como é sabido, os sertanistas podiam vender os negros que aprisionassem nos quilombos. E não foi só Jorge Velho que fez disto uma indústria rendosa.

A marcha dos latifúndios através do vale foi profunda: pela margem esquerda (a pernambucana), os rebanhos entraram até o vale do Paracatu, e, pela margem direita (a da Bahia), atingiram o rio das Velhas. Graças à formação desses grandes latifúndios, pode ser mantida a unidade territorial da Colônia, com a criação dos caminhos internos, que, convergindo para o vale do São Francisco, rasgaram

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