O Médio São Francisco. Uma sociedade de pastores guerreiros

colado à casa do proprietário. Com o rolar dos anos, os descendentes dos sesmeiros com as índias se foram misturando com as filhas dos vaqueiros, igualmente mestiças, e se fizeram também vaqueiros. As antigas fazendas dos papa-léguas coloniais foram sendo retalhadas entre centenas de herdeiros, e hoje são os sítios e fazendas da ribeira e das caatingas interiores do São Francisco. Uma ou outra família conseguiu manter em proporções menos ridículas a extensão de suas terras. As velhas fazendas construídas pelos pioneiros estão hoje sob o regime do condomínio, contando cada condomínio com quarenta ou mais condôminos. As fazendas maiores são as mais recentes, construídas de pequenas fazendas compradas de vários herdeiros, que, emendadas umas às outras, formam as atuais soltas para engorda ou, o que é mais comum, são deixadas no abandono, improdutivas, a menos que haja carnaubeiras dentro dos seus limites; o que, porém, só acontece nos tabuleiros. As fazendas de maior proporção, no São Francisco, hoje, contam no máximo com quatro léguas de extensão, que representam dez ou vinte mil hectares.

E não é de hoje a decadência do latifúndio no São Francisco. Já em 1832, a condessa da Ponte, residente no Rio, dava procuração. ao Sr. Francisco Antônio Malheiros para vender suas propriedades vizinhas à cidade da Lapa. Antes disso, ou seja, em 1831, o Cap. Plácido de Souza Fagundes comprava aos Srs. Manoel de Saldanha da Gama, Melo Torres de Guedes de Brito e à sua mulher, Dona Joaquina Castelo Branco, em Londres, as terras e benfeitorias de parte da mesma fazenda, a famosa Itaberaba, da Casa da Ponte. Para que se tenha uma visão da decadência do latifúndio basta compulsar velhos inventários existentes no Cartório dos Feitos Civis de Pilão Arcado, nos quais uma mesma fazenda sesmeira da Casa da Torre, já em 1830, aparece retalhada entre aproximadamente mil condôminos. Trata-se da fazenda Gado Bravo, já no século XVIII dividida em duas. Para chegarmos a esses inventários, tivemos de recorrer a vários arquivos particulares, pois, devido às lutas entre famílias rivais e às constantes inundações do São Francisco, os cartórios das cidades ribeirinhas estão reduzidos à mais constrangedora inutilidade. Por isto, poucos documentos existem para orientar as incursões do curioso nos assuntos históricos que se proponha a conhecer fatos relacionados com a formação dos latifúndios no São Francisco. Mas consta - e a tradição oral aí está para nos ajudar - que, na sua marcha para atingir o Piauí, Garcia d'Ávila construiu uma base de abastecimento na altura de Santo Antônio de Pilão Arcado, onde fez construir vários currais

O Médio São Francisco. Uma sociedade de pastores guerreiros - Página 31 - Thumb Visualização
Formato
Texto