Raízes do Brasil

Cedo não há de haver vilão:

todos d'El Rei, todos d'El Rei,


exclamava o pajem da Farsa dos Almocreves. Por estranho que pareça, a própria ânsia exibicionista dos brasões, a profusão de nobiliários e livros de linhagem constituem, em verdade, uma das faces da incoercível tendência para o nivelamento das classes, que ainda tomam por medida certos padrões de prestígio social longamente estabelecidos e estereotipados. A presunção de fidalguia é requerida por costumes ancestrais que, em substância, já não respondem a condições do tempo, embora persistam nas suas exterioridades. A verdadeira, a autêntica nobreza já não precisa transcender ao indivíduo; há de depender das suas forças e capacidades, pois mais vale a eminência própria do que a herdada. A abundância dos bens da fortuna, os altos feitos e as altas virtudes, origem e manancial de todas as grandezas, suprem vantajosamente a prosápia de sangue. E o círculo de virtudes capitais para a gente ibérica relaciona-se de modo direto com o sentimento da própria dignidade de cada indivíduo. Comum a nobres e plebeus, esse sentimento corresponde, sem embargo, a uma ética de fidalgos, não de vilãos. Para espanhóis e portugueses, os valores que ele anima são universais e permanentes.

O mérito pessoal, quando fundado em tais virtudes, teve sempre importância ponderável. Semelhante concepção é que, prolongada na teologia, iria ressuscitar, em pleno século XVI, a velha querela do

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