Escravidão Negra em São Paulo

Um estudo das tensões provocadas pelo escravismo no século XIX

chancela científica desde que Nina Rodrigues não hesitou em endossá-la em estudo onde se ocupa, entre outras coisas, da participação decisiva de sudaneses, sobretudo de sudaneses que seguiam a fé maometana, e liam o Corão, nas rebeliões de escravos. Foram as pesquisas de Luís Viana Filho, mais recentemente confirmadas pelos notáveis trabalhos de Pierre Verger, que mostraram o infundado de semelhante crença. Sabe-se hoje que, salvo durante algumas dezenas de anos, predominaram sempre os bantos no rol dos africanos importados para a Bahia, tal como aconteceu nas outras partes do Brasil.

Nenhum sentido teria para o historiador procurar demorar-se em investigar por exemplo a origem remota ou próxima dos contingentes de africanos introduzidos em São Paulo, seja nos tempos em que perdurou o tráfico atlântico, seja depois que se apelou para o tráfico interprovincial, e se a autora do presente estudo cogitou no problema, foi de raspão e para abandoná-lo. Em verdade, não acharia ela senão por acaso, informações fidedignas acerca dos grupos tribais que, em grande ou pequena escala, se introduziram, através dos séculos, em terra paulista. Depois, como não há termos de comparação possível entre as situações que levaram à importação de pretos africanos e crioulos nas duas áreas, as questões que se podem suscitar para uma delas, ou são inexistentes ou são diferentes quando se trate da outra. Na Bahia, como é notório, as levas de negros diretamente vindos da África, nunca cessaram de ingressar, desde que se iniciou a colonização efetiva, no século XVI, até por volta de 1850, e em muitos casos é conhecida a exata procedência, a rota, a tonelagem e até os nomes dos navios negreiros com aquele destino. Para São Paulo houve alguma importação direta já no primeiro século, de outra forma não se pode explicar facilmente porque Afonso Sardinha tinha negócios com Angola em navio de um cunhado seu, segundo deixou dito em testamento de 1597, embora não seja escusado pensar que boa parte dos negros eventualmente trazidos naqueles tempos devessem ser mandados a Buenos Aires e, através de Buenos Aires, para Potosi. Depois disso, e durante a maior parte dos tempos coloniais, se até as comunicações com o Rio de Janeiro não eram constantes e por longo tempo dependeram apenas das sumacas dos padres da Companhia, não há lugar para pensar-se em comunicações transoceânicas. Estas recomeçarão, ainda que timidamente, no final do século XVIII e irão prosseguir até meados do seguinte, quando passa a prevalecer o tráfico interprovincial, que se prolongará até pouco antes da Abolição.

Essas considerações necessariamente esquemáticas podem conduzir-nos a algumas precisões acerca do escravismo em São Paulo durante a maior parte desse período. Parece inútil voltar neste ponto à discussão sobre a parte considerável que teriam tido os negros na região. Essa questão e, em particular, a participação de pretos e mulatos no bandeirismo, torna-se ociosa quando se sabe que a tese em que se dá maior ênfase a tal participação resulta largamente do significado

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