também o seu deserto, na caça do cavalo chimarrão e na presa da rês alçada. Guardou nos olhos a nostálgica visão dos tempos livres e a última golfada de luz que tombou sobre as coxilhas verdes e nuas, sem as farpas dos moirões.
O deserto do beduíno, por ser árido e exsicado, permaneceu inviolável, menos interessante à cobiça desmedida. Aqui, os senhores da terra tomaram e dividiram o que a todos pertencia, cravando, de longe em longe, os marcos de pedra em nome da Lei.
O gaúcho converteu-se, pouco a pouco, nesse pária que vai sobrando da sociedade e vivendo às margens das cidades populosas, esquecido já da liberdade que foi sua e convertendo-se a uma nova espécie de nomadismo — que é o nomadismo da miséria, desfibrando-se, diluído em massas informes e flutuantes, em passos gigantescos para o fim.
Torna à indagação aflitiva do espírito a sentença impressionante de Euclides da Cunha, diante do exame da paisagem étnica brasileira: predestinamo-nos à formação de uma raça histórica em futuro remoto, se o permitir dilatado tempo de vida nacional autônoma. Invertemos, sob este aspecto, a ordem natural dos fatos. A nossa evolução biológica reclama a garantia da evolução social. Estamos condenados à civilização. Ou progredimos ou desaparecemos.(139) Nota do Autor
Na sua orfandade social tinha o gaúcho, antes, tudo quanto necessitava para viver. E vivia, diz o historiador argentino Vicente Lopes, absoluto e independente com o seu individualismo próprio e livre.