lavrar a terra perdida nos latifúndios sem raias, que avassalam a terra e favorecem aos filhos da Fortuna em prejuízo de milhares de criaturas deserdadas, nem curar as feridas sociais que ainda estão sangrando, sem remédio...
O gaúcho foi abandonado. Foi esquecido. Foi espoliado. Restituamos ao homem dos campos o campo que lhe pertenceu para que ele possa, de novo, rasgá-lo e, de novo, semeá-lo com as próprias mãos. Asseguremos ao gaúcho simples, generoso e bom, um pedaço da terra que foi sua — o seu rancho de barro, a cevadura de erva-mate, o punhado de brasas de seu galpão e a tira de carne que foram os elementos fundamentais de sua vida — se quisermos salvar, ainda em tempo, do naufrágio que se avizinha, o que de maior e mais alto existe no patrimônio moral das nossas tradições. Hegel, pelas próprias conclusões de Euclides da Cunha, teria que alterar, aqui, sua teoria das três condições geográficas que criam diferenças étnicas entre os homens. Não diria que a flora rudimentar, reviçando vigorosa nas quadras pluviosas, dando um incentivo à vida pastoril, às sociedades errantes dos pegureiros, num convite à vida aventurosa do armar e desarmar das tendas, não fixaria, porém, o homem à terra. Aqui, pelo contrário, a estepe bordada de verde, onde o sol desata longa a sua sombra pelo chão, não teve a força centrífuga do deserto, na teoria de Hegel. Não repeliu. Não desuniu. Não dispersou. Se não ligou o pampa à humanidade pelo vínculo nupcial dos sulcos dos arados, na frase de Euclides, mesmo assim o pampa não constituiu jamais um isolador étnico como as cordilheiras,