de sentir e é a forma mentis de toda uma sociedade que só aparentemente se despojou dos velhos padrões. Nem se pode cuidar que deva ser grande o abismo entre os homens que escrevem e os que fazem e vivem a História.
O fato é que desse conservantismo intrínseco, e tanto mais genuíno quanto não é, em geral, deliberado, parecem ressentir-se as atividades dos portugueses mesmo nas esferas em que chegaram a realizar obra pioneira. Se é certo, por exemplo, que foram eles os iniciadores na Europa da expansão oceânica, mal se pode afiançar que sua atividade veio abrir, por este lado, uma etapa nova nos processos de colonização e conquista. Mesmo comparada dos castelhanos, tão aferrados como eles a tudo quanto, sem dano maior, pudesse ainda salvar-se do passado medieval, sua obra ultramarina é eminentemente tradicionalista.
O ímpeto da Reconquista, que não tivera tempo de esfriar quando achou de súbito seu novo campo de ação - um mundo antes incógnito, cheio de estranhos sortilégios, habitado, não de infiéis no sentido estrito e usual da palavra, mas de gentios e idólatras, o que não devia fazer grande diferença entre os mais sanhosos - bastaria, talvez, para imprimir à expansão castelhana o cunho nitidamente imperial que logo a distingue, e onde parece residir sua grande novidade.
Alguns seriam tentados a filiar essa novidade a insondáveis razões étnicas, que pairassem acima de todas as contingências. É um modo, este, de simplificar, não de esclarecer o problema. Poderia lembrar-se também que a tradição e, porventura, certa vocação imperial não seria estranha ao caráter dos espanhóis, e ainda aqui andaríamos perto daquelas misteriosas razões que dispensam explicação ou inquérito. É exato que, neste caso particular, elas têm em seu favor certos fundamentos históricos pelo menos impressionantes.
Não estaria de acordo com a tal tradição a existência em outros tempos daquele "império" asturo-leonês, depois leonês-castelhano, curiosa tentativa de restauração visigótica, onde historiadores da altitude de um Menendez Pidal ainda encontram a alma da história da Espanha através de um período que chegou a perdurar quase três séculos? E posto que o título de imperador, sugerindo uma soberania nacional ou peninsular, alheia e eventualmente contraposta à do Sacrum Imperium, tenha morrido com Afonso VII, não é significativo que a aspiração imperial vá ressurgir um século mais tarde, na Península, com Afonso X, o Sábio? Há entre os dois casos, porém, uma diferença apreciável, pois se temos, no primeiro, ainda a ideia do antigo "império" leonês, ideia então vacilante e quase desvanecida, no outro já