Visão do paraíso

Os motivos edênicos no descobrimento e colonização do Brasil

de paz e da amizade, com o que, ganham maior segurança, de um lado, e de outro podem arriscar-se a assaltos inesperados, com efeitos mais terríveis sobre uma gente inofensiva.

A malevolência e vivacidade da crítica não é de natureza a deturpar, em todo caso, os traços distintivos da ação colonizadora dos portugueses nas partes do Oriente e pode-se ajuntar desde já que também em outras partes, ao menos nos tempos iniciais, quando ela ainda não se deixara seduzir pelos modelos que fornecem os castelhanos. O que consta neste caso do libelo de Grócio já está em palavras brandas e às vezes com intuitos apologéticos, em outros escritos dos mesmos portugueses. Para lembrar um só exemplo, pode citar-se certo "Livro das Cidades e Fortalezas da Índia", redigido por volta de 1582 e que, guardado desde aquele tempo em Madri, só intimamente chegou a ser exumado. Nessa obra explicam-se, em conclusão, os motivos que tinham levado el-Rei D. Manuel a adotar no Oriente os métodos que dessem lucros maiores com menores dispêndios. É certo que, tendo cessado em parte aqueles motivos, outros pareciam-lhe, já então, os processos aconselháveis.

O que tinham feito os portugueses, desde os tempos do Senhor D. Manuel de gloriosa memória foi, escreve seu autor, entrar na Índia "com tenção de paz e não de guerra, acerca dos Príncipes e povos daquelas partes, significando-lhes que deles não pretendiam mais interesse que amizade e comunicação de comércio, por comutação de ouro e prata e muitas mercadorias que levavam do Ocidente; oferecendo justamente com isso paz e amizade del-Rei de Portugal seu senhor, cuja embaixada levavam em conformidade disto aos reis e príncipes das partes a que chegavam". A razão dessas cautelas estava nisto, diz ainda, que entendia el-rei "que este nome de comércio e trato era o melhor e mais suave modo com que, sem escândalo nem alvoroço daqueles povos orientais, poderíamos entrar naquelas partes e ser melhor recebidos". Além disso, "para mais autoridade e crédito do mesmo negócio e mor conservação dele", parecera então mais conveniente fazer-se em nome del-rei e por conta de sua real Fazenda.

Isso não impedia que nos lugares de maior trato e comércio mandasse el-rei assentar feitorias por conta de sua fazenda e "fazer casas-fortes a modo de fortalezas com título de feitoria, para guarda das mercadorias e defensão dos ministros e gente dela". E mesmo, nos lugares onde fossem os portugueses mal recebidos e se negassem os moradores e príncipes a todo gênero de paz e comércio, não hesitavam aqueles em ir às armas, domando-os por força delas e fazendo então as ditas feitorias, "não com título de

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