Visão do paraíso

Os motivos edênicos no descobrimento e colonização do Brasil

para Castela, dedicada muito mais à política europeia, as Índias distantes continuariam a ser, durante largo tempo e apesar de suas imensas riquezas, um simples instrumento da mesma política. Em contraste com Portugal, que vivia em bem maior grau das suas terras ultramarinas e para elas, a hegemonia na Europa era ali preocupação mais poderosa, absorvente da maior parte dos soldados e aventureiros que, fossem outras as circunstâncias, se veriam canalizados, certamente, para as Índias.

É sobretudo graças à ajuda da famosa infantaria espanhola que Carlos V, em sua campanha contra os príncipes da Liga de Esmalcalda alcançou alguns notáveis triunfos no Danúbio e no Elba. E se de fato lhe ocorreu o pensamento de colocar a Espanha no lugar da Alemanha como centro do Santo Império, foi devido ao papel decisivo das tropas ibéricas em Mühlberg.(16) Nota do Autor E essa participação ativa dos espanhóis não cessaria, antes tomaria vulto crescente, depois que Carlos deixou a cena política. Sob Filipe II, sem embargo de seus projetos de ver-se coroado "Imperador das Índias", os campos da Itália, de Flandres, da Alemanha, continuariam a exigir o recrutamento de soldados espanhóis que em todos esses lugares se faziam ora admirados pelo denodo, ora, e talvez com maior frequência, malquistos pela soberba. Às vezes também ridicularizados, pois essa vanglória distingue tanto os fidalgos como a gente popular, que uns e outros viviam a ostentar fumos de grandeza e de nobreza. Não se manifestava tal prosápia apenas no porte, no trajar, no excesso de suscetibilidades, no ponto de honra, o "pundonor", senão nos próprios apelidos, invariavelmente prolixos e altissonantes que gostavam eles de exibir; a história contada por Quevedo de certo personagem chamado Mata, que por ser "nome de pouco ruído" mudou-o para Matorral,(17) Nota do Autor serve para mostrar, no entanto, como esse uso, de que aliás não se achavam imunes os próprios portugueses, se fizera notável também aos olhos dos nacionais.

E não só o afã guerreiro deveria fazer mais atraente para esses espanhóis a Europa, a Itália em particular, do que as suas Índias, embora servisse muitas vezes para dourar a atração. Um historiador que vê na expansão mediterrânea do poderio ibérico um prolongamento da velha política dos reis de Aragão, pôde dizer que, com Fernando, "a cruzada espanhola saiu da Península, não para mergulhar deliberadamente na África miserável, não para perder-se no Novo Mundo, mas para situar-se abertamente no próprio coração da Cristandade de então, em seu coração

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