casamentos mistos, os quais, diante da mudez da lei, continuam a regular-se pela legislação anterior.
A desigualdade e injustiça nesses casos são manifestas. Tolera-se simplesmente o casamento entre membros de seitas dissidentes, efetuado segundo as prescrições de seu culto, quando devia ser-lhes concedido um casamento civil como um direito absoluto, sujeito a nenhuma restrição, e a nenhum dos muitos abusos a que dá ocasião um casamento não civil. Ora, o casamento dos não católicos, pelo fato de ser simplesmente tolerado, tem como consequência ser considerado ilegítimo aos olhos da religião católica, que é a religião do Estado, e as autoridades eclesiásticas se julgam com o direito de assim considerá-lo quando bem o entendam.
Suponhamos um caso que facilmente se pode dar. Um casal, de qualquer das seitas dissidentes, cujos cônjuges se venham a incompatibilizar, chega à conclusão de que se deve desunir, cada qual dos seus componentes pretendendo casar-se de novo: basta que cada qual se dirija a seu respectivo sacerdote, abjure a sua religião, adote o Catolicismo, e peça licença para contrair novo casamento com quem deseje.
O sacerdote não pode opor a menor dúvida; recebe-os no seio da Igreja Católica e assegurou-lhes a licença para casar uma segunda vez, porquanto a Igreja Católica considera com mero "concubinato" um casamento que não foi efetuado diante dela e conforme os seus preceitos. Fatos como tais já se têm dado entre nós, e a sua repetição virá solapar as bases da família, retirar-lhe toda a sua força moral e implantar a imoralidade sancionada pela lei.
Por outro lado, a lei de 11 de setembro de 1861 nada regula quanto aos casamentos mistos: por conseguinte, continuam esses a se regular pela legislação anterior, isto é, são feitos perante um sacerdote católico e de conformidade com os ritos católicos e os usos sancionados pela lei civil. Ora, a Igreja Católica não consente casamento entre um membro de seita dissidente e um católico, a não ser com a condição de que aquele se comprometa por juramento a criar e educar os filhos na religião católica.
Que injustiça, que humilhação para o não católico que pretenda unir-se pelos laços matrimoniais com pessoas pertencentes às famílias do país! Tem que se submeter a uma pesada e humilhante condição se deseja casar-se com uma mulher brasileira. É obrigado a fazer calar os reclamos de sua consciência, que afirmam ser a sua religião a melhor, e a jurar que seus filhos serão educados em princípios que ele julga inferiores aos seus.