Expedição às regiões centrais da América do Sul v.1

aos gritos, oferenda que o pai ou a mãe acabava de fazer ao astro da noite. Chegando à extremidade da fila, cada par balançava a rede ao som de cantos que todos repetiam unissonamente e que pela toada monótona pareciam formados somente de duas ou três palavras continuamente repetidas. Pouco depois ouviu-se a voz aguda de uma velha horrorosa, semelhante a um esqueleto e que, com os braços levantados, fez várias voltas em torno da assembleia, desaparecendo depois em silêncio. Enquanto isso, o homem de movimentos elétricos cabriolava ainda mais furiosamente, detendo-se somente um instante ao passar pela fila das mulheres. Parecia pender o corpo do lado delas e descrevia com o corpo ondulações semelhantes às de uma minhoca que se retorce sobre si mesma. Sacudia violentamente a cabeça, como se quisesse transmitir a elas o fogo, de que se sentia possuído, depois, endireitando-se num movimento brusco, dava uma nova carreira. Durante todo este tempo ouvia-se no aldeamento a voz retumbante do orador, que repetia sem descanso um nome barroco. Depois, aí, esse personagem aproximava-se com lentidão, trazendo sobre as costas um soberbo feixe de penas vermelhas e, debaixo do braço, um machado de pedra. Atrás dele uma mulher, com o filho pequeno amarrado à cintura e protegido contra o frio da noite por uma esteira. A passos medidos passeou o par durante alguns instantes, indo-se depois sem proferir palavra. Neste momento, toda a assembleia fez coro com o orador cantando o mesmo nome barroco e repetindo-o interminavelmente, em lugar do que até então vinha cantando e era para nós não menos ininteligível. Durou esta cena muito tempo, mas cessou subitamente quando a lua se pôs. Pudemos então dormir sossegadamente, verificando ao despertar que tudo havia voltado à calma; nada lembrava as danças infernais da noite que acabava de passar.

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