que avivarei em seu espírito perdidamente absorvido pela garridice e pelo governo da moda.
As Memórias da Rua do Ouvidor têm, em falta de outras, um incontestável, grande e precioso merecimento, pois começa já e imediatamente, sendo os seus hipotéticos leitores poupados aos tormentos do prólogo, proêmio, introdução, ou coisa que o valha, em que, de costume, o autor, abismado em dilúvios de modéstia, abusa da paciência do próximo com a exibição de sua própria pessoa afixada no frontispício do monumento.
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Salvo o respeito devido à sua atual condição de rica, bela e ufanosa dama, tomo com a minha autoridade de memorista-historiador, e exponho ao público a Rua do Ouvidor em seus cueirinhos de menina recém-nascida e pobre.
A atual rainha da moda, da elegância e do luxo nasceu...
É indeclinável principiar por triste confissão de ignorância: não sei, não pude averiguar a data do nascimento da rua que desde 1780 se chama do Ouvidor, do que a ela disso não resulta prejuízo algum, e pelo contrário ganha muito em sua condição de "senhora"; porque isenta de aniversário natalício conhecido, não há quem ao certo lhe possa marcar a idade, questão delicadíssima na vida do "belo sexo". Que afortunada predestinação dessa Rua do Ouvidor!...
São menos felizes que ela as próprias senhoras nascidas no último dia de fevereiro em ano bissexto, as quais têm o condão de aniversário natalício só de quatro em quatro anos...