que o artista primevo gravou no interior das cavernas de Altamira e Alter do Chão a figura do mamute.
E, como iremos nós, em penadas quase ilegíveis, fazer que o leitor compreenda o homem das selvas; ele cujos ouvidos já de há muito se habituaram ao ritmo metálico da civilização industrial. A nota aguda da araponga na profundeza do mato soa de maneira tão diversa do tinir da bigorna na atmosfera quente da oficina! O alarido dos símios na floresta faz vibrar dentro em nós corda mais íntima e grave que a prosopopeia vazia dos políticos da cidade ou as canções sem vida de uma prima-dona barata. Um índio nu, em pleno mato é alguma cousa mais viva e palpitante que essas figuras que vêm catalogadas em tratados de antropologia. Será mais fácil darmos uma vista d'olhos nas três moradias características dos aborígenes. Se tiver estômago, alivie-se o leitor de tudo quanto não for os remanescentes selvagens que ainda se encontram na alma do mais civilizado cidadão e empreenda conosco uma viagem retrospectiva no tempo.
Para isso teremos que tomar uma canoa em Belém, onde o Amazonas se despeja no oceano até o ponto onde se dá o conúbio das águas pretas do rio Negro que vem do Norte, com a corrente amazônica. Depois, impulsionaremos a montaria, ora a remo, ora a varejão ao longo das barrancas do Negro até ao âmago desse inferno verde onde o tormento do inseto é constante e já tão longe da civilização que não mais haverá esperança de escaparmos às mandibulas ciclópicas que esse fecundo monstro telúrico vai fechando por trás de nós de maneira tanto mais impressionante quanto mais nos embarafustamos pelo sertão a dentro e ganhamos o Uaupés no extremo noroeste brasileiro. E, quando três mil quilômetros de corrente serpeante, ladeados por seis mil quilômetros de mato verdejante, tiverem deixado, já, em nossas almas, profunda impressão, abandonaremos