Viagem ao Brasil nos anos de 1815 a 1817

nesse particular enorme vantagem aos botocudos e demais "tapuias" da costa oriental, pois confeccionam lindos trabalhos de penas, que de modo geral se assinalam por uma bela e intensa cor vermelha. Vê-se no real gabinete de História Natural de Lisboa uma coleção extremamente interessante de ornamentos raros, os quais, pela delicadeza, lembram os dos indígenas das Ilhas Sandwich. Como exemplo posso referir, entre outros, a notável cabeça mumificada, que faz parte da coleção de raridades antropológicas do Senhor Ritter Blumenbach, em Göttingen. Está representada na 44ª estampa das " Decades Craniorum, porém sem as penas, ao passo que na figura 1 da 17ª estampa de nosso atlas, ela aparece em toda sua beleza. As mulheres, que em todas as partes do mundo têm mais vaidade e mais gosto do que os homens para se enfeitarem, levam pouca vantagem aos homens, aqui nessas matas virgens; pintam o corpo com as mesmas cores e do mesmo modo que os homens, trazem no pescoço os mesmos colares e ainda um fino cordel de "tucum". Usam igualmente "batoques" nas orelhas e no lábio; é-lhes peculiar o costume de enrolar as pernas, desde os joelhos até os tornozelos, com fibras de "gravatá" ou embira, a fim de conservá-las finas.

Seja como for, os "tapuias" da costa não usam deformar o corpo. Não há entre eles o costume, que tem os "omaguas" ou "cambevas", de comprimir a testa entre duas tábuasNota do Autor, para dar a aparência de lua cheia, nem o de achatar o narizNota do Autor, como contaram dos "tupinambás" os velhos viajantes franceses; não mais se encontram tais costumes nesses povos, hoje civilizados. As crianças dos botocudos são por vezes muito bonitas e já em tenra idade mostram um topetezinho na cabeça.

As tribos indígenas do Brasil em seus caracteres morais assemelham-se tanto quanto na constituição física. Domina as suas faculdades intelectuais a sensualidade mais grosseira, o que não impede que sejam às vezes capazes de julgamento sensato e até de uma certa agudeza de espírito. Os que são levados entre os brancos observam atentamente tudo quanto vêm, procurando imitar o que lhes parece visível, por meio de gestos tão cômicos, que a ninguém pode escapar o significado de suas pantomimas. Aprendem mesmo, facilmente, certas habilidades artísticas, como a dança e a música. Mas, como não são guidados por nenhum princípio moral, nem tampouco sujeitos a quaisquer freios sociais, deixam-se levar inteiramente pelos seus sentidos e pelos seus instintos, tais como a onça nas matas. Os irreprimíveis ímpetos de suas paixões, a vingança e a inveja em particular, são neles tanto mais temíveis, quanto irrompem rápida e subitamente. É também frequente esperarem uma oportunidade favorável para exercer vingança, dando então plena expansão aos seus intentos. Nunca deixam