Botânica e agricultura no Brasil no século XVI

me hospedava. Cautelosamente arrastou-se de lá até perto do lugar em que a fogueira acabava de extinguir-se. Chegada ali reuniu as brasas restantes soprou sobre elas, e, enquanto gesticulava e murmurava muito baixinho, embolou cabelos e ervas que consigo levava, atirou-as sobre o braseiro, fazendo movimentos cabalísticos e dirigindo olhares satânicos para as redes em que dormiam os filhos dos seus amos, escarafunchou os cabelos da cabeça, arrancou mais alguns e atirou-os sobre o fogo. Por alguns instantes contemplei aquela cena sem poder compreender a sua significação; depois saltei da rede, arrastei-me para junto da pobre criatura e detive-a. O seu espanto foi grande, mas por meio de sinais logo me fez compreender que estava exercendo feitiçaria com o intuito de aduzir moléstias e desgraças sobre os filhos da gente que a escravizara. Com insistência suplicou-me que não a revelasse. Sua fisionomia impressionou-me como se fosse de víbora perigosa, que valendo-se da escuridão, se dispõe a picar o tarso do seu inimigo.

Não foi, no entanto, a primeira vez que tinha tido ocasião para presenciar práticas de feitiçaria entre os aborígenes. Tornando silenciosamente a minha rede, pus-me a considerar quantas ilusões; quanto entenebrecimento se deviam ter apoderado da mente do homem que aqui viveu, até que chegou ao ponto de temer forças ocultas e desconhecidas e pretender conjurá-las para prejudicar ao seu semelhante - quando considerei que esta superstição só podia ser o resto de um culto puro à natureza, e mais, que uma série de vicissitudes e complicações devia ter precedido esta degradação -; foi como se escamas caíssem dos meus olhos, comecei a compreender o mistério; vi que esta gente não mais vivia na inocência e ingenuidade paradisíacas. Com isto todas aquelas teorias vazias do tal Jean Jacques,

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