– Igreja, iluminismo e escolas mineiras coloniais. (Notas sobre a cultura da decadência mineira setecentista).

A falta de mulheres brancas é aguda; os aventureiros da mineração acham difícil conjugar a vida andeja e aleatória da procura de alúvios auríferos com o regime estável, ancorado do casamento; as Minas Gerais estão cheias de pretas escravas ou mulatas forras, solteiras, concorrendo com os homens nas minas, nas vendas, nas estradas, em casa, nas igrejas, a ponto de escandalizarem, as mais audaciosas, os próprios governadores, com o seu convite ao pecado e à coabitação, sem responsabilidades nem consequências - eis os motivos da elevada porcentagem dos concubinatos, que enchem todas as páginas dos livros de devassas, na proporção de quase cinco para uma das outras culpas castigadas.

Há, por exemplo, nas oito freguesias visitadas pela autoridade diocesana em 1733-1734, 184 concubinatos masculinos e 195 femininos, enquanto as outras transgressões, todas reunidas, não passam de 44. É preciso dizer, antes de tudo, que os homens casados, em geral, comportam-se bem: há poucos casos de concubinagem entre eles, pouco mais 5%. Tanto os brancos como os outros casados de cor. Já desponta o respeito que o homem mineiro terá pelo seu lar, pela família: casado, cuida de dizer adeus às farras da solteirice. Geralmente será o homem do campo o que busca mais frequentemente o estado matrimonial; será nele, principalmente, que irá ter seu sólido fundamento a família mineira típica, amiga das coisas estabelecidas e apegada ao que é seu, o sangue, a casa, a propriedade. Por isso é que a religião será em Minas algo de muito natural, como um geral patrimônio de todos, a garantir-lhes uma estabilidade que não é apenas espiritual, mas até físico-social, cheia de segurança e consolação. Mas, a imensa maioria dos homens culpados de concubinato é constituída de brancos solteiros livres. De portugueses, portanto. Perfazem um total de 149, em 184 casos. É verdade que as devassas não estabelecem distinção de cor e de ocupação, por exemplo, entre os artífices, tidos pacificamente como brancos, mas onde sabemos existirem inúmeros mulatos, aprendizes de seus pais brancos: alforriados pelos pais e exercendo uma "arte", sobem naturalmente à condição de senhores e de brancos. As devassas destacam mais os artífices amancebados, com certeza porque mais salientes na sociedade urbana, onde vivem; são geralmente jovens e estão começando a vida, ainda sem recursos suficientes para montarem suas "moradas de casas" para o casamento. Eles são alfaiates, sapateiros, ferreiros, carapinas, ferradores, pintores, e se arranjam com as suas negras carinhosas e submissas.

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