Conheci Heitor Lyra há precisamente 40 anos, quando ele veio servir, em Genebra, como secretário da delegação do Brasil à Liga das Nações, então chefiada por meu pai. Lyra era, como recordei no livro A Alma do Tempo, "o enfant terrible da delegação, faiscante e mordaz, muito vibrátil na sua exígua estatura". Em capítulos de memórias por ele próprio publicados na imprensa brasileira, lembro-me de que recordou, também, essa fase distante da nossa mocidade.
Poucas vezes nos temos encontrado depois, neste quase meio século transcorrido desde as nossas conversas, à beira do Léman, sobre Eça de Queirós e Anatole France. Ele sempre no estrangeiro, onde se fixou definitivamente, depois de aposentado; eu envolto, um pouco contra a vontade, no atribulado destino da nossa geração, quando não também em missões no estrangeiro, distantes dos pontos de sua residência. Nas vezes em que tenho passado por Lisboa, onde ele vive, não nos pudemos ver. O fato, porém, de andarmos desencontrados nestes 40 anos, não impede que eu lhe haja acompanhado a exemplar vida de funcionário e o prosseguimento da sua já consagrada obra de escritor.
É por isto tudo que, saudando o ilustre historiador Heitor Lyra, que depois deste grande livro bem poderia vir sentar-se na Academia Brasileira à sombra de Taunay, de Garcia, de Oliveira Lima ou de Pereira da Silva, exprimo o meu entusiasmo de leitor pela vitória do meu amigo de mocidade.
AFONSO ARINOS DE MELO FRANCO
Botafogo, 1.º de maio de 1964