um dos capítulos mais impressionantes da formação dos latifúndios em nosso país, e revelam a presença de uma espécie de "máquina" para a conquista das terras, em que as tribos aldeadas e os missionários iriam figurar como comparsas, não raro contra a vontade, em proveito dos poderosos, que manejavam facilmente as autoridades régias, como demonstração do que já representava o poder econômico, nessa hora tão recuada de nossa história territorial.
Nesses episódios, destaca-se a personalidade de frei Martinho de Nantes, pela sua impetuosa bravura, pelo seu devotamento, pela vivacidade apaixonada com que sabia defender a causa dos índios, que acabavam, afinal, perdendo todos os confrontos, numa espoliação que até hoje ainda não cessou, não obstante o sacrifício de seus defensores. Embora atribua todo o mérito de suas batalhas à presença de Deus, não falta a frei Martinho uma certa dose de ufanismo, com algumas parcelas de ingenuidade, que refletem a profunda sinceridade de seu relato. O certo é que a sua Relação agradou tanto a seus superiores, que acabaram lhe pedindo outra. Houve duas Relações, separadas por um largo período de tempo, com uma segunda parte, que bem poderia ter sido chamada de terceira.
A primeira edição do livro, reunindo as duas Relações, é de 1706. Só muito mais tarde, já em 1888, apareceria uma segunda edição, por iniciativa dos Archives Générales de l'Ordre des Capucins, em Roma, sob os cuidados do Rev. Pe. Apolinário de Valença, religioso da mesma ordem de frei Martinho. Devo, aliás, a frei Jacinto de Pallazzolo, que foi superior dos capuchinhos do Rio de Janeiro, o conhecimento dessa segunda edição, bem como o oferecimento de um exemplar, que muito facilitou a documentação de meu Pernambuco e o S. Francisco.
Apareceu na Bahia uma terceira edição, fac-similar, prefaciada e anotada pelo historiador Frederico G. Edelweiss, e impressa na Tipografia Beneditina no ano de 1952. A reimpressão foi dedicada ao Segundo Congresso de História da Bahia, e seu ilustre anotador observa que considerava "impossível estudar o ciclo do curraleiro, o povoamento do sertão baiano e das regiões limítrofes do Norte e do Nordeste sem consultar Martinho de Nantes". Mas, como ele próprio assinala, essa edição fac-similar, que se devia à colaboração do então diretor da Biblioteca Nacional, o ilustre Eugênio Gomes, não seria de muita significação, uma vez que, "ao corpo da letra e à impressão irregular do original, juntou-se a ação do tempo, que dificulta a nitidez da reprodução.