Relação de uma missão no Rio São Francisco

Prefácio do Autor

Talvez vos surpreenda, meu caro Leitor, o não encontrardes nesta Relação ações fulgurantes, as aventuras e as maravilhas que haveis lido nas relações das missões do Japão, do Peru, do Sião, da China, da Cochinchina, do Tonquim e de alguns outros reinos nas Índias, onde tantos notáveis missionários revelaram seu zelo, e vários deles se distinguiram pelo sangue que derramaram, assim como o de tantos que conseguiram converter para a nossa fé. Aprouve a Deus revelar o Seu poder nesses reinos policiados e povoados por vários milhões de anjos, pois que o julgou necessário, para a sua conversão. Mas não tendo sido convocado por Deus para essas grandes tarefas, que excediam minhas forças, e nossas missões da província da Bretanha estando limitadas ao Brasil e à Palestina, não trabalhei senão na conversão dos pobres selvagens, que não têm nem Reis, nem Leis, nem Governo, nem artes, nem ciências, nem escrita, e que vivem antes como animais do que como homens (o que decerto merecerá vossa reflexão). Se Deus não fez coisas extraordinárias para a sua conversão, é que não o julgou necessário, conquanto tenha feito o bastante para que conhecessem a verdade e para os colocar no caminho da salvação. A oportunidade do martírio não se oferece aos nossos missionários, nem aos novos convertidos, pois que não há nem príncipes, nem leis que ameacem com a morte os que pregam o Evangelho, nem os que ó recebem. Há, todavia, ocasiões de sobra para o sofrimento, pela falta de comodidades, pelas perseguições e pelos perigos a que se acham expostos os que procuram cumprir o seu dever, como tereis ocasião de verificar nesta Relação. Encontrareis, também, motivos para admirar a bondade de Deus na conversão desses pobres selvagens e vereis os efeitos maravilhosos da graça, assim como de uma providência amorosa, para a proteção dos missionários; tereis, assim, com que satisfazer vossa curiosidade e a vossa piedade. Mas não vos escandalizeis com a narrativa de algumas ações que vos parecerem ousadas ou demasiadamente

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