Apontamento sentimental sobre os textos
Antônio d'Oliveira Pinto da França
Há muitos anos, desde que estas cartas vieram parar às minhas mãos - tinha eu vinte anos -, que imaginava trabalhá-las e publicá-las, um dia. No período que se segue à independência das antigas colônias portuguesas em África, a sua publicação reveste-se de particular oportunidade e oferece temas de comparação e meditação. Com efeito, está constantemente presente nesta correspondência a angústia da opção entre o Brasil e Portugal, por parte dos membros de uma família apanhada por um temporal histórico que ia determinar fundas modificações no curso dos dois países e nas suas próprias vidas. Essas páginas estão carregadas das dúvidas, da lucidez, dos medos, do sofrimento e da coragem com que seguiam e se envolviam, dia a dia, nos acontecimentos que se desencadeavam em torno deles. Constituem o testemunho da participação de uma família variada, na gestação da Independência brasileira.
Não é minha intenção escrever um prefácio a este conjunto de cartas, com a preocupação de fazer rigorosa inserção delas no período histórico da Independência da Bahia, a que dizem respeito. É evidente, isso compete a um estudioso desse período. Pretendo localizá-las romanticamente no espaço, dar-lhes uma terceira dimensão. Recorro a esse usado adjetivo, no sentido de uma certa permissividade de sentimentos da minha parte, ao manejá-las e interpretá-las. Não me fixei severamente nos fatos, deixei que a minha imaginação trabalhasse sobre eles, tanto quanto esses fatos o permitiam. Entendi ainda que, do ponto de vista "romântico", a narração dos acontecimentos que rodearam o meu trabalho - curiosamente começado no Rio e terminado em Bissau - e as linhas de sangue e sentimentos que entrelaçaram esses acontecimentos dariam às cartas um novo sabor, essa terceira dimensão,