A pantofagia ou as estranhas práticas alimentares na selva. Estudo na Região Amazônica

Na seca, com o rebaixamento dos níveis fluviais, os barrancos ficam mais altos, o que dá, por vezes, às calhas a feição de desfiladeiros. Como se fossem muralhas a serem escaladas, os íngremes degraus dos barrancos, cavados nas próprias abas, formam acesso precário aos povoados que parecem plantados no cocuruto de uma torre. Vimos, dessa maneira, os barrancos de Fonte Boa, São Paulo de Olivença, Porto Acre e outros.

Falando da povoação de São Fernando, perto da barra do Içá, o ouvidor Sampaio se admirava da elevação do terreno, que tornava exaustiva a subida. O terraço, entretanto, era planíssimo.(4) Nota do Autor

As terras fronteiras são geralmente mais rasas pela própria mecânica dos rios que, ao se chocarem com os paredões, desviam a força de suas torrentes para o lado oposto, sem deixarem, entretanto, de solapar as bases dos abarrancados, de onde, de quando em quando, sobrevir o fenômeno da "terra caída". Arrastando na queda habitações, árvores e animais, desabam extensas abas de terra, com um rumor inusitado. O volume de argila precipitado nas águas perturba o curso dos rios. A terra, conforme seja inverno ou verão, apresenta peculiaridades que condicionam a movimentação humana. Quando o transeunte não se arrisca ao soçobro nas águas escachoantes ou precípites, escorrega no chão mole, balouçante e viscoso.

Na "terra firme", que fica muito além das várzeas e onde podem desenvolver-se os peneplanos oriundos da ação erosiva, é onde as enchentes esbarram; em pleno mundo florestal ou no âmago das mesopotâmias, a situação é diferente pela contextura mais rígida do terreno, que passa a ser sustentado pelas rochas ou pela textura potente das raízes. É há o "centro", esse longe que o orícola pervaga atrás da seringa, da castanha, do cedro, da andiroba ou da caça.

A vida humana, de caráter social, processa-se à margem do rio. É essa margem é assentada, quanto mais a jusante das torrentes, em plena convulsão do barro, porque assim o exige a construção inexorável que ainda se plasma na imensa arena quaternária da Hileia.

No rumo das cabeceiras, das pedras, das cachoeiras, o grés pontifica na majestade de um comportamento orogênico, maciço e sólido. Porém, mesmo aí, o barro tem o seu clima, haja vista os artefatos cerâmicos dos silvícolas do alto Xingu, ainda que rudimentar e de poucas virtudes artísticas.

O barro é cerâmica, reboco, petardo de caça (mabogãpino) e, paradoxalmente, alimento.

A salinidade, ainda que rara, em certos depósitos de argila é facilmente explicável, desde que todo o sal contido nos oceanos derivou

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