Já vimos que o barro comestível oferece variadas gamas de pureza, tornando-se de fácil digestão. Porém, justo é ressaltar que os grupos argilófagos não se contentam com os barreiros existentes à mão, nem sempre oferecendo a melhor pasta.
Ora, ao provar o barro, ao julgá-lo apetecível e ao incorporá-lo ao repasto, o indígena o tornou indispensável, não só como reserva contra as crises e substitutivo da farinha, como iguaria a que se acostumara pelo contingente de sal de seu conteúdo, numa terra onde esse cristal era desconhecido para muitas tribos e, por outro lado, praticamente inexistente no seio florestal, conforme já foi aqui demonstrado.
Entre os Txukahamãi (nome dado pelos Juruna: "gente sem arco") ou Metotire, a ctonofagia foi constatada pelos irmãos Villas-Boas (Cláudio e Orlando), em relatório apresentando sobre esse agrupamento ao SPI — Serviço de Proteção ao Índio — em 1953: "Sobre um fogo ainda mal apagado havia pedaços de terra-cupim enegrecidos pelo fogo. Essa foi a primeira prova que tivemos de que os txukahamãi comiam terra."(6) Nota do Autor
E mais adiante:
"No rumo para a aldeia pisamos uma picada bastante batida, através da mata espessa, subindo e descendo serrotes que constituem os primeiros contrafortes da serra do divisor Xingu-Tapajós. A marcha se desenvolveu sem novidades através do terreno acidentado do caminho, apenas com rápidas paradas, quando os índios, abandonando o 'pique', retiravam pedaços de terra de certos cupins para comer. Isso vinha confirmar as primeiras notícias de que deles tivemos quando chegamos à região do Xingu, isto é, de que comiam terra."(7) Nota do Autor
E ainda: "Embora não possamos afirmar utilizarem-se estes índios de terra como alimentação básica, vimo-los, entretanto, ingerir terra de todos os tipos: desde o cupim (preferida), até areia da praia".(8) Nota do Autor
Nas informações prestadas em sua própria língua, os Metotire diziam: "Txukahamãi puká kukren" ("Os Txukahamãi comem terra") e "Juruna puká kukren kati" ("Juruna não come terra").(9) Nota do Autor
Desses rápidos extratos sobre a vida dos Metotire podem ser extraídas algumas observações:
Em primeiro lugar, os dados revelam que os Txukahamãi não ingeriam o barro plástico (tabatinga ou caulim), mas a terra evidentemente saibrosa conhecida como "casa-de-cupim", porém de dissolvência