Ensaios de etnologia brasileira

para a igreja. Os adultos educados nas missões só vão à missa nos domingos e dias feriados. Em Meruri, no pátio situado entre os edifícios da missão não se deve dançar nem cantar à maneira índia. Mas na praça limítrofe rodeada pelas cabanas dos Bororo, as festas tradicionais são celebradas. A crença no deus e no diabo dos cristãos é compatível com a dos bope, dos demônios. A gente assiste na igreja os sacerdotes dizerem missa, e na casa dos homens às reuniões para solenizar o banquete dos mortos. É verdade que já muito do antigo se perdeu. Em Meruri não há mais os sonidores místicos e os instrumentos de sopro tão característicos dos antigos Bororo.

Por outra parte, obedece-se ainda a certas abstenções religiosas. Por exemplo, o Bororo, em geral, não come veado e está convencido de que essa carne lhe faz mal, embora não faça ao branco. Porém a autoridade do bari, do médico-feiticeiro, e das leis nas quais se baseia o poder dele, vai desaparecendo. Até há pouco tempo, os Bororo podiam comer o milho só daquele pedaço de uma plantação que tinha sido exorcizado por haver sido circunvagado pelo bari. Não podiam usar nada do trecho limítrofe enquanto este não tivesse sido tratado da mesma maneira. Hoje só uma espiga é levada ao bari, sendo suficiente, no dizer do meu informante, "para o milho de todo o mundo", que o médico-feiticeiro exorcize essa única espiga. Outrora podia-se comer uma anta somente depois do bari lhe haver mordido a cabeça. Hoje, começa-se imediatamente a comê-la, levando só mais tarde

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