no aspecto religioso. Os cultos gêge e nagô quase se fundiram num só, o culto que Nina chamou gêge-nagô e que hoje se poderia chamar, conforme Artur Ramos, de sincretismo intertribal. Esta inicial fusão religiosa, poderosa na sua organização e na sua força de difusão, serviria de base para as fusões posteriores. É verdade que mais tarde se foi dando a absorção dos elementos gêges. Hoje, pelo menos, é o que observamos nas seitas africanas de Pernambuco. Os componentes gêges apenas salpicam de algumas marcas o ritual e a liturgia nagôs. Da mesma maneira que são salpicados de marcas bantos, minas ou muçulmanas. Isto, sem falarmos na influência espírita, ameríndia e católica que, em todos os xangôs, tem conseguido penetrar de modo constante e crescente, a ponto de, em alguns terreiros, haver uma verdadeira equiparação entre os componentes da religião africana dominante - a nagô - e os componentes da religião católica. Temos a impressão de que, com o tempo, o Catolicismo se vai tornar dominante, com a absorção da religião nagô.
Muitos traços culturais dos negros se conservaram no Brasil e se integraram à cultura brasileira. Não obstante a situação de escravos em que se encontravam. Deslocados violentamente do seu ambiente nativo. Afastados do seu meio familiar e social. Mutilados nas manifestações próprias de suas culturas. A sua resistência cultural mostrou-se particularmente notável no modo de preservar as religiões. Certamente porque é a religião uma manifestação de cultura espiritual. Manifestação de vida espiritual persistente e capaz de resistir, mais que qualquer outra, à obra de esfacelamento e dissolução imposta por vezes pelos conflitos de culturas.